segunda-feira, 19 de abril de 2010

Senhora dos Afogados em Processo

Primeiros rascunhos de uma construção a partir do treinamento físico do ator.
Videos do primeiro mês e fotos do terceiro mês da montagem, que estreará em setembro completando os nove meses de processo.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Dança da Suspensão

Exercício que trabalha o equilíbrio e a precisão dos movimentos, utilizando a consciência completa da respiração através do abdômen.









A música no jogo do ator meyerholdiano
Béatrice Picon-Vallin




"Eu trabalho dez vezes mais facilmente com um ator que ama a música. É preciso habituar os atores à música desde a escola. Todos ficam contentes quando se utiliza uma música "para a atmosfera", mas raros são os que compreendem que a música é o melhor organizador do tempo em um espetáculo. O jogo do ator é, para falar de maneira figurada, seu duelo com o tempo. E aqui, a música é sua melhor aliada. Ela pode não ser ouvida, mas deve se fazer sentir. Sonho com um espetáculo ensaiado sobre uma música e representado sem música. Sem ela, - e com ela: pois o espetáculo, seus ritmos serão organizados de acordo com suas leis e cada intérprete a carregará em si" (1).
Assim exprime-se Meyerhold nos últimos anos de uma vida em que sempre considerou sua "educação musical como a base de (seu) trabalho de encenador" (2). Meyerhold aprendeu a tocar piano, e sobretudo violino. Chegou mesmo a hesitar em fazer uma carreira musical, e Chostakovich, em suas memórias, fala dos "remorsos" do grande encenador que, nos momentos mais sombrios dos anos 30, imaginava-se um pequeno violinista tocando seu instrumento com desvelo, em alguma parte da orquestra... (3) De uma grande cultura musical, Meyerhold podia tanto ler uma partitura quanto substituir o maestro de seu teatro ou sentar-se ao piano. É rodeado, ele e seu teatro, de compositores, Gnessin, Prokofiev, Chostakovitch, que tornaram-se célebres, ou de grandes intérpretes, Oborin, Sofronitski. A colaboração com estes compositores foi benéfica para ambas as partes, seja para as pesquisas de Meyerhold relativas à música no teatro, seja para os próprios compositores a quem Meyerhold dava impulsos criadores (conf. as óperas O amor das três laranjas de Prokofiev, ou O Nariz de Chostakovitch) e sobre cujas obras ele refletia ativamente, pensando em montá-las (4). Meyerhold fez igualmente de V. Chabalin (5) um muito interessante compositor de música teatral, através de um trabalho prolongado e rigoroso com ele (final dos anos 20 e anos 30), ao longo de sete espetáculos.

Nas encenações "clássicas" de Meyerhold, O Inspetor Geral, A desgraça de ter espírito, A Dama das camélias, a música - seus ritmos, seu fluxo e seus silêncios, suas pausas - penetra o teatro tanto como material organizado quanto como princípio organizador da ação cênica, do jogo do ator, do conjunto da composição meyerholdiana e de um modo de percepção dinâmica do público (6). Mas já em 1914, quando expõe para Tchekhov a concepção que tem de seu Jardim das cerejeiras, "abstrata como uma sinfonia de Tchaikovski" (7), a música é para ele, não um fundo, mas a grade de interpretação de uma dramaturgia, um ponto de apoio para a composição cênica, um meio de triunfar sobre o naturalismo, uma vez que ela coloca em cena um ritmo que rompe com o mundo do cotidiano. Logo, e com o exemplo de Chaliapin, feliz síntese, segundo ele, de rítmica plástica e musical, modelo de "verdade teatral", Meyerhold afirma: "É pena que o ator do drama não esteja submetido ao autor pela precisão de uma rítmica que este lhe forneceria sob forma de partitura escrita" (8). Fundamental tanto para o encenador quanto para o ator, a música vai impregnar progressivamente os modos de criação de Meyerhold e, afirmando-se através do culto dedicado à música nos círculos simbolistas que freqüenta no início do século, tornar-se uma figura constante de sua produção teatral, antes e depois de 1917.


Uma teoria do contraponto

Inicialmente, ele realiza uma reflexão profunda sobre a encenação da ópera, mergulhando nos escritos de Appia, de Craig, depois de Fuchs, de Wagner, de Hagemann, antes de montar Tristão e Isolda no Teatro Mariinski, encenação-chave para o conjunto de sua obra e que lhe serviu de objeto para um longo artigo teórico (9). Ele busca compreender as especificidades da ópera e mais amplamente do teatro da convenção, de um teatro onde a música seria concebida como "substância da ação" (10), e que o encenador deve abordar partindo, não do libretto, mas da partitura, de seu espírito e de seu ritmo. São os tempi, as modulações, que ditam os jogos de cena. Conseqüência direta para o ator de ópera: seu gestual, de acordo com o texto teórico de Meyerhold ou com as descrições dos críticos da época, é uma pantomima que, no espaço de uma "cena-relevo" estritamente arquitetada para uma expressividade máxima, é composta pelas "ondas rítmicas dos movimentos corporais" (11), e chega a tornar-se dança. "Lá onde a palavra perde sua força expressiva começa a linguagem da dança" (12), escreve ele, referindo-se ao Nô. Em seu Tristão e Isolda, os grupos ou as unidades esculturais formadas pelos atores animam-se musicalmente, passando da imobilidade a movimentos rápidos, e mesmo à corrida (como um pouco mais tarde, em 1911, na encenação de Orfeu de Gluck). O ator submete-se ao desenho tônico da partitura para realizar um desenho plástico simples, claro, concentrado, baseado sobre um princípio de economia, capaz mesmo de definir um traço esboçado pela orquestra, e até de completar a partitura, e portanto de introduzir uma espécie de diálogo com ela. Meyerhold busca no jogo de seu ator um ritmo de movimentos "rigorosamente sincronizado com o da música", "uma concordância rítmica" (13), sem todavia que este jogo ilustre a música, mas a revele e complete.

Mais tarde, na classe de "Técnica dos movimentos cênicos", que ministra de 1913 a 1917 no Estúdio da rua Borodin - seu "laboratório", no qual conduz um trabalho paralelo a suas encenações suntuosas nos Teatros Imperiais da capital - procura precisar as relações da música e do movimento, falando desta vez não de uma reflexão e de uma prática sobre a ópera, mas de um trabalho sobre os scenarii da Commedia dell'arte. A pesquisa se apoia sobre o estudo do papel da música "em Dalcroze, na srta. Duncan, na srta. Fuller, no circo, nas variedades, nos teatros chinês e japonês" (14). Na prática do Estúdio, a música é concebida como "uma corrente que acompanha os deslocamentos do ator sobre o espaço cênico e os momentos estáticos de seu jogo". "A música", escreve Meyerhold no programa de seu curso para o ano 1914-1915, "e os movimentos do ator podem mesmo não coincidir, mas, simultaneamente chamados à vida, em seu curso (a música e o movimento, cada um em seu plano pessoal), manifestam um gênero de polifonia. Nascimento de um novo tipo de pantomima onde a música e os movimentos do ator reinam em seus respectivos planos. Os atores, sem dar ao espectador a construção da música e dos movimentos em um cálculo métrico do tempo, procuram tecer uma rede rítmica". É, formulado claramente, um primeiro esboço da teoria meyerholdiana do contraponto, fundamentando as leis cênicas do movimento do ator no tempo e no espaço. Depois de 1917, Meyerhold recusará, desta vez categoricamente, perante seus estudantes do GEKTEMAS (Ateliês Teatrais Superiores do Estado), a aplicação das teorias de Dalcroze - largamente difundidas na Rússia - ao teatro e qualificará de absurdas as danças de I. Duncan em razão de sua tediosa e repetitiva simetria em relação à música (15).

Essa teoria do contraponto encontrará uma de suas melhores aplicações na encenação de A Dama de espadas de Puchkin-Tchaikovski, em 1935, no Pequeno Teatro Dramático de Leningrado, onde a direção de atores de Meyerhold coloca a crítica teatral em presença de um "ator autenticamente musical, conservando exteriormente a liberdade de seu comportamento teatral, mas de fato ligado à música durante todo o tempo em um complexo contraponto rítmico. Seus movimentos podem ser invertidos em relação ao metro da música, acelerados ou ralentados; entretanto, mesmo sua pausa estática sobre o fundo de um movimento rápido da orquestra e, digamos, um gestual rápido sobre o fundo de uma pausa geral na música devem estar estritamente apoiados sobre a partitura da encenação, concebida como o contraponto cênico da partitura do compositor" (16). A crítica musical vai portanto no mesmo sentido que Meyerhold, que afirma: "Esforçamo-nos em evitar fazer coincidir o tecido musical e o tecido cênico sobre a base do metro. Aspiramos à fusão contrapontística dos dois tecidos, musical e cênico" (17).

A Dama de espadas, "op. 110" de seus trabalhos de encenação, é dedicada ao pianista V. Sofronitski... Espetáculo notável, que exigiria a publicação da partitura cênica ou mesmo do scenario da encenação. Apoiada pela luz, a música de Tchaikovski aprofunda as ações cênicas, desnuda as emoções silenciosas dos personagens. Desvela por exemplo, a cada um dos passos de Liza, que desce a escada do dispositivo enquanto sua amiga Paulina canta, sempre no alto do salão de música, as diversas emoções experimentadas pela jovem. Ou ainda, faz com que os espectadores escutem as batidas do coração de Hermano, o ruído de sua respiração, no início do terceiro ato em que, sobre a mesma música da introdução, ele sobe na ponta dos pés, com a longa capa arrastado-se atrás, a escada cujo oval caprichoso, ritmado pelas rupturas de dois patamares, ocupa toda a cena e enquadra o quarto da velha condessa, em baixo. Ele se imobiliza, estatiza no patamar inferior e depois, à entrada dos violinos, sobre as colcheias, torna a partir para estatizar de novo, no alto, quando escutamos as semicolcheias, perante o retrato da velha, onde cantará em seguida seu monólogo (18). Meyerhold e seu ator seguem a música e opõem-se a ela ao mesmo tempo, obtendo poderosos efeitos, como a queda da condessa já morta, até a imobilidade em sua cadeira, no silêncio, depois do acorde final.

Há nesta Dama de espadas um balanço das pesquisas meyerholdianas seja no domínio da ópera seja no do teatro musical, da "musicalização do teatro"; todo o trabalho de Meyerhold sobre a música no espetáculo serve tanto à ópera quanto ao teatro.


A organização sonora

Em Petersburgo, sua encenação do faustoso Baile de máscaras de Lermontov é acolhida como "uma ópera sem música", segundo a expressão do crítico musical I. Sollertinski, expressão que já encontramos sob a pluma do crítico Iartsev a propósito da encenação de Irmã Beatriz de Maeterlinck em 1906. Em O Professor Bubu, de A. Faiko, montada em 1925, Meyerhold diz estender a mão a "todos os esfarrapados da ópera" em um espetáculo-laboratório em que fez seus atores passarem por uma severa escola de representação, onde "a música está presente quase ininterruptamente, onde o material verbal torna-se uma espécie de recitativo livre como em Prokofiev (O Jogador). Como no teatro chinês, ela é um estímulo para mobilizar a atenção do espectador" (19).

Para não ser interpretada nem como música de diversão nem como uma ficção estética, a música neste espetáculo é produzida em cena, ou antes acima dela, em um estrado dourado, suspenso, em forma de concha, iluminada pela chama de lanternas, por um pianista de casaca instalado perante um piano de cauda, em total dissonância aliás com as luzes brilhantes que o envolvem e os reclames elétricos que compõem o cenário "urbanista" de Professor Bubu. À música que ele interpreta durante todo o espetáculo (Lizst e Chopin) superpõem-se os sons produzidos pela flexível barreira de bambus suspensos em anéis metálicos que contorna a área de representação e ressoa a cada entrada e saída dos atores, desempenhando o papel da matraca dos teatros orientais avisando o espectador do acontecimento teatral que se vai realizar, atraindo sua atenção. "A música torna-se uma espécie de co-construção", escreve V. Fedorov, um dos assistentes de Meyerhold, "e o pianista, o maestro da representação, detendo-se um instante sobre o centésimo compasso da Sonata de Dante e a interrompendo com um estudo de Chopin, retorna alguns minutos depois ao Liszt que ficara em suspenso" (20).

Sem nos ocuparmos das tarefas de agitação consagradas à escolha da música e às acentuações musicais, destinadas a desacreditar uma burguesia e uma intelligentsia decadente, conciliadora e oportunista face à revolta que cresce na rua, sublinhemos a organização sonora do espetáculo, esta "co-construção" musical que completa a do dispositivo e que é destinada por um lado a suscitar no espectador o máximo de associações, ou seja, uma percepção não cotidiana, mas artística, criativa, e por outro lado a ordenar o jogo de cada ator, cada um dos quais "devia estar plenamente consciente do laço que existia entre cada movimento, cada frase, e o ritmo, o tempo, a tonalidade do trecho musical que o acompanhava" (21). A riqueza dessa "trilha musical" da qual damos as referências no final deste artigo evoca bem a complexidade das tarefas exigidas aos atores, que devem abafar o ruído dos passos e evitar sua interferência na música; cada instante, cada passo é construído ritmicamente, em um entrelaçamento das réplicas, dos movimentos, da música, que liga-se às técnicas dos atores orientais. M. Turovskaia, autor de um belo livro sobre a atriz Babanova, observa a propósito de Bubu que "os espetáculos de Meyerhold eram para o teatro o que os versos são para a prosa: nenhum tempo vazio" (22). O espetáculo, de um novo gênero, denominado "tempodrama" no catálogo do Museu do Teatro Meyerhold, permenece incompreendido (23); os ritmos ralentados, em contraponto com a partitura musical e os jogos de cena em arco, executados sobre o tapete oval, são difíceis tanto para o ator quanto para o espectador. Mas aqueles que participaram dele terão feito seus estudos para O Inspetor Geral, representado no ano seguinte, para aquilo que Meyerhold chamará, muito convencionalmente, o "realismo" musical.


A composição musical nas técnicas do encenador e do ator

Desde sempre, Meyerhold liga obstinadamente teatro e música, "a arte mais perfeita" como dirá em 1938 a seus estudantes do GITIS, como já dissera em 1914-1915 aos de seu Estúdio da rua Borodin, porque ela "encontra em si mesma a força de seu desenvolvimento" (24). Meyerhold busca ligar o movimento e a música, mas também a palavra e a música. Sua longa colaboração com o compositor Gnessin, a elaboração conjunta do princípio de leitura musical o testemunham. Em uma experiência feita sobre os fragmentos da Antígona de Sófocles, Gnessin escreve para o coro e Antígona uma partitura com notas e pausas acima de cada verso, de maneira que, sustentados por um acompanhamento, os intérpretes tivessem as mesmas restrições e a mesma liberdade que os cantores. Associada a um trabalho plástico, esta técnica de interpretação, apresentada por Scriabin, produz nele um tal efeito que logo projeta utilizá-la em um mistério a ser representado sobre as margens do Ganges, no qual incluiria todos os membros do Estúdio meyerholdiano (25).

O processo de "musicalização" toca todos os domínios do teatro. E logo de início o trabalho dramatúrgico. A composição dos scenarii de encenação de Meyerhold, onde a música real tanto pode estar ausente quanto pode estar presente, segue as leis da forma-sonata, uma parte lenta intercalada entre duas partes rápidas. O melhor exemplo deste trabalho é A Dama das camélias cujos cinco atos são divididos em episódios, todos designados por um termo musical que lhes dá o colorido, o ritmo, a velocidade. Um exemplo:
Iº ato, 2ª parte Capriccioso
Lento
Scherzando
Largo e maesto (26).




Meyerhold busca colocar na obra a representar uma dramaturgia musical com introdução, exposição do tema principal, aparição de temas secundários, desenvolvimento, repetição do tema principal, culminação, final, com mudanças de ritmos, rallentandi geradores de tensões (neste exemplo, lento, rallentando, scherzando, culminação). Reencontramos este processo ao nível do trabalho de encenação: "em música", diz Meyerhold a seus estudantes, "há uma acumulação de acordes de sétima que o compositor introduz conscientemente e que por muito tempo, muito tempo, não se resolvem na tônica (...). Há a alternância de momentos estáticos e de momentos dinâmicos, seguida de equilíbrios e desequilíbrios... Estou a ponto de dar a resolução de uma cena, mas, conscientemente, não a resolvo, ponho mesmo obstáculos a esta resolução e depois, no fim, a permito" (27).

Enfim, esse processo toca os grandes princípios do jogo do ator, elaborados, depois aprofundados, sistematizados por Meyerhold em seu Estúdio de Petersburgo, nos cursos de Maestria cênica em Petrogrado em 1918, depois em Moscou, nos GVYRM, GVYTM, no Ateliê Meyerhold e nos GEKTEMAS. O período construtivista de Meyerhold - onde ele torna ascético, desnuda, demaquila o ator, veste-o com um uniforme de trabalho e desvela seus músculos e o esqueleto de seu corpo e de seu jogo - tem suas raízes, sua fonte viva em suas longas pesquisas sobre a Commedia dell'arte (realizadas juntamente com V. Solovióv), e sobre os teatros orientais, onde ele não concebe o movimento, "o elemento mais poderoso da cena", senão ligado à música. Exagero um pouco dizendo que somente o vocabulário difere e a vontade de sistematização, o amadurecimento da teoria. O comediante dell'arte, alegre improvisador, transforma-se em alegre "auto-motor" e a concepção da "arte como junglagem" (28) evolui para uma arte vista como trabalho eficaz, preciso, rigoroso. Entre essas duas utopias teatrais, a dos anos 10, a utopia do jogo permanente, da máscara e da mistificação, a utopia da Commedia dell'arte vivida através de Hoffmann e Gozzi, e a do início dos anos 20, a utopia da industrialização, da taylorização, da maquinização, não há diferença de natureza, ao menos no que concerne ao ator. Aqui, como lá, o jogo deve ser absolutamente eficaz, expressivo, ritmado, geometrizado. Não há ruptura, mas apenas o encontro de um público e uma adequação profunda à época, o que Meyerhold denominará "o fogo purificador" da Revolução (29). Assim, a pantomima bem-amada de Meyerhold (anos 15), a caça onde, em uma atmosfera de conto oriental, os atores perseguiam, miravam, e depois abatiam, com seus arcos e flechas imaginários, um pássaro maravilhoso, torna-se o curto exercício do "Tiro com o arco", varrido de todo assunto ou contexto anedótico e destinado ao treinamento biomecânico dos atores. E outros exercícios passam também do "laboratório" pré-revolucionário ao "laboratório" pós-revolucionário.

A música conserva, em todos os Ateliês meyerholdianos após 1917, sejam quais forem as suas denominações, um papel primordial (30). Lev Sverdlin, um dos bons biomecânicos de Meyerhold, escreve: "Com a biomecânica e os elementos de pantomima, Meyerhold nos habituava à música clássica. Fazíamos exercícios, não somente com um acompanhante que tocava valsas ou polcas, mas sobre a música de Rachmaninov, Tchaikovski, Chopin, Schubert. Ele educava nosso gosto musical." Assim, o exercício de biomecânica intitulado "O Tiro com o arco" é acompanhado sucessivamente de trechos de um Estudo em C bemol de Chopin, do Prelúdio da primeira fuga de Bach, de um Estudo em A maior de Schlosser, e a parada que o precede e conclui é executada ao som do Casamento de Trolkugen de Grieg. "Era, continua Sverdlin, como se distribuíssemos nossos movimentos sobre a música. Sem ilustrá-la, vivíamos nessa música (...). Como o violinista tem seu instrumento, o pianista seu piano, o ator tem a si mesmo" (31).

Assim, o movimento biomecânico é concebido sobre o modelo de uma frase musical: "Da mesma forma que a música é sempre sucessão precisa de medidas que não rompem a integridade musical, nossos exercícios são uma sucessão de movimentos matematicamente precisos que devem ser precisamente distinguidos, o que não impede absolutamente a clareza do desenho de conjunto" (32). Dois termos de biomecânica continuam sendo muito utilizados depois do período construtivista e estão fortemente ligados à música. Trata-se antes de tudo do conceito coberto pelo termo de mecânica tormoz, ou freio, frenação, ou seja, todo ralentar da ação cênica antes de uma explosão, suscitado ou não por um obstáculo que surge sobre a linha de um movimento orientado. É através desses rallentandi no interior da representação que esta pode arquitetar-se, desenvolver sua musculatura, ao mesmo tempo que o rallentando cria tensões no conjunto da composição cênica ou na micro-estrutura da cada cena ou jogo de cena. A este conceito (tormoz) está ligada a técnica do znak otkaza (literalmente "sinal de recusa"), enunciado e praticado no Estúdio da rua Borodin em 1914 (33), definido em termos biomecânicos como fixação dos pontos em que começa, ou acaba um movimento, e visto, no conjunto do jogo do ator, como um movimento de curta duração em sentido inverso, opondo-se ao movimento geral ou à direção deste movimento: recuo antes de avançar, impulso da mão que se ergue antes de dar um golpe, flexão antes de ficar em pé. Este breve movimento facilita o trabalho do ator ao mesmo tempo que sublinha uma situação cênica, reforça a expressividade corporal, ou individualiza um estado psicológico. V. Bebutov, colaborador próximo de Meyerhold no início dos anos 20 recorda que, para ele, esta técnica de decomposição do movimento biomecânico está ligada ao conceito coreográfico de "preparação" e associada ao bequadro (que em russo também pode ser chamado de znak otkaza), ou recusa provisória de uma alteração ascendente ou descendente da nota, do sustenido ou do bemol (34).


O cálculo do tempo cênico.
Do acrobata ao ator chinês.

Para criar seu jogos de cena, Meyerhold tem uma necessidade física de música: acontece-lhe, segundo testemunhas de ensaios, de renunciar a colocar em cena um episódio porque, sem música, lhe é impossível encontrar o rallentando, a frenação rítmico-plástica que procura (35). Essa música é primeiro uma música de estudo, escolhida a título de experiência, aproximativamente, dentre as partituras disponíveis, de acordo com as exigências de Meyerhold. Antes de trabalhar sobre O Professor Bubu, Meyerhold faz seu pianista L. Arnchtam tocar todas as grandes obras de Chopin e de Lizst para piano, excluindo a priori apenas as rapsódias húngaras. O pianista toca durante horas, dia após dia. Meyerhold escolhe então quarenta obras que são novamente executadas e compõe então, sob os olhos do pianista, as grandes linhas da encenação, representando todos os papéis e criando na música seus próprios acentos, os cortes, as repetições que lhe são necessários. Para O Inspetor Geral, Meyerhold exige de Arnchtam que toque a cada ensaio novas romanças, sublinhando que é somente em uma abundância de material musical que a trupe conseguirá executar as complexas tarefas impostas pela peça (36). Sublinhemos de passagem que O Inspetor Geral é um espetáculo da abundância, no qual o próprio processo do trabalho criador, do nascimento de múltiplas variantes, da escolha dentre a riqueza dessas eventualidades se reflete na encenação, na medida em que deixa traços perceptíveis, analisáveis à luz das complexidades, e mesmo das contradições do longo trabalho de ensaio.

A música do espetáculo pode ser dada de saída para os atores (como a de Bubu), mas ela pode também passar por um estágio de música de ensaio para ser substituída, paulatinamente, por uma música escolhida de forma definitiva ou escrita especialmente para o espetáculo, por um compositor, segundo as indicações extremamente precisas de Meyerhold (37), que exigia também que ele participasse regularmente dos ensaios.

O que devem retirar os atores de Meyerhold desse trabalho de treinamento ou de ensaio com música? Deixemos-lhe a palavra, no curso de 19 de novembro de 1921 (38) para os estudantes do GVYRM (Ateliês Superiores de Estado de Encenação):

"Faço meus alunos trabalharem sobre um fundo musical, não para colocar a música em cena, mas para que se habituem ao cálculo do tempo, para que se apóiem nele. Vocês me perguntam: não seria possível, em lugar da música, utilizar simplesmente um metrônomo? Não, não é o suficiente. O metrônomo desempenha o mesmo papel daqueles que batem em pequenas tábuas como se faz no teatro japonês com o objetivo de criar um fundo para a representação (39). Mas isto não nos satisfaz, nós que pertencemos a uma outra cultura; isto resulta tedioso para nós. Sobre um roteiro métrico, temos necessidade de um fundo rítmico. Pude observar como vocês distinguiam as dissonâncias e as consonâncias. Percebo que em 1921 é consonância aquilo que, no século XIX, soava ainda como dissonância. Mais ainda, aquilo que, apenas há dez anos, parecia dissonância é agora percebido como consonância. Quando toquei um acorde de Scriabin, notei com alegria que ele suscitava um sorriso agradável. Vivemos agora em uma cultura tal que se pode tocar um acorde de Scriabin e suscitar um sentimento de prazer, embora ele não seja construído de acordo com as regras acadêmicas.

"Isto significa que é melhor fazer estes exercícios sobre um fundo de muito boa música (40) e, além disso, imediatamente acostumar os atores a traduzir a música na linguagem do movimento, tanto métrica quanto ritmicamente, habituá-los a construir uma partitura de movimentos que corresponda à partitura musical.

"No circo, quando o acrobata trabalha em seu trapézio, tudo é realizado a partir de um cálculo extraordinário, o menor desvio em relação a este cálculo leva ao fracasso. Há uma diferença colossal no trabalho do acrobata segundo a música esteja ou não presente: quando a música não toca, o acrobata tem mais chances de cair. É por isso que, quando trabalha, ele quer música, e, mais que isso, uma música que lhe agrade particularmente, que entre em todos os seus movimentos. Assim, a maioria das vezes um acrobata tem sua própria música, escolhida por ele.

"Ele tem necessidade de um fundo sobre o qual apoiar-se solidamente. Isto significa que existe uma precisão rítmica, mas não precisão musical. Ele é livre em seus movimentos e pode pegar o trapézio, soltá-lo e saltar quando quiser. Não o lança necessariamente em um tempo forte, pois não trabalha metricamente, mas ritmicamente. Se pudéssemos registrar seus movimentos em um aparelho perfeito, obteríamos resultados espantosos. Costumo explicar o ritmo como qualquer coisa que luta contra, que se opõe à monotonia do metro. Portanto, um acrobata que trabalha no trapézio não utiliza os tons fortes e fracos, mas constrói a música de seus movimentos de tal forma que ela seja uma segunda partitura que, se fosse escrita com precisão, coincidiria totalmente ritmicamente, ou seja, criaria uma co-ritmia.

"Como traduzir isto na linguagem do ator? Se vocês criarem o hábito, em seus exercícios, de relacionar-se com um fundo musical, afinarão seus ouvidos de tal maneira que acontecerá a mesma coisa que ontem, quando os tempos de silêncio, de um exercício para outro, eram retidos em seus ouvidos como uma espécie de fluxo rítmico e vocês sentiam as pulsações musicais.

"Primeiro, há resistência: vocês imaginam, cantarolam, e depois são carregados como por uma onda na música. Se além disso balançarem-se, encontrarão ainda mais facilmente. Quando visitei em Constantinopla uma escola corânica, observei o seguinte: o mestre lia um texto do qual o aluno deveria se lembrar. Ele segurava o rapazinho pela manga e, na mão esquerda, tinha o livro. Lia o texto e o rapazinho repetia depois dele, e ambos balançavam-se. Neste contexto, a memorização se fazia mais racionalmente, melhor que sem o balanço. A memorização baseava-se sobre o fato de se estabelecer assim um ritmo do texto, e de que este ritmo era melhor percebido com a presença do balanço. Quando o ator trabalha sobre um papel, qualquer que ele seja, depois de se ter acostumado no contexto-laboratório do Estúdio a trabalhar sobre um fundo musical, terá sempre o hábito de prestar atenção no tempo, mesmo se a música estiver ausente".

O exemplo do acrobata de circo para evocar um tipo de jogo que, ligado ao tempo, cria uma co-ritmia com a música, seguido, para ilustrar o papel do movimento rítmico no processo de memorização, de uma referência ao oriente, é característico do pensamento meyerholdiano e de seus dois pólos de ancoragem. Desde que viu Ganako e Sadda Iako no início do século até seus deslumbramentos diante de Mei-Lan-Fan em 1935, Meyerhold refere-se obstinadamente ao jogo musical do ator japonês e chinês. Perante o sentido de ritmo de Mei-Lan-Fan, todos os atores soviéticos deveriam empalidecer, segundo Meyerhold, que escreve: "Nós não temos o sentido do tempo. Não sabemos o que quer dizer economizar o tempo. Mei-Lan-Fan o conta em quartos de segundo e nós o contamos em minutos, sem mesmo contar os segundos..." (41).

Talvez, mais do que tudo, Meyerhold tenha retirado de seu conhecimento do teatro oriental toda a importância que atribui à pausa no jogo do ator: "a pausa", escreve Meyerhold em 1914, "não é ausência nem cessação de movimento, mas, como em música, ela guarda em si mesma um elemento de movimento" (42). Ele ensina então a seus atores a "escutar o silêncio" (43) para, "depois de ter compreendido a significação da pausa, não deixar de viver na ação cênica". E esta pausa, de "passiva", pode igualmente tornar-se ativa, centro, culminação da ação, ser sentida como o grito do silêncio (na encenação de Culpado ou Inocente de Strindberg em Terioki em 1912), ou como uma abertura escancarada sobre um vazio monstruoso (as pausas do ator Garin em O Mandato de N. Erdman).

Assim, o despertar de sua musicalidade, a presença da música, a composição musical das macro e micro-estruturas da encenação devem dar ao ator o domínio do tempo teatral, fornecer pontos de apoio, sinais precisos e exatos, permitindo ao ator assim limitado orientar-se no tempo e no espaço (44). Essencial por ser, segundo Meyerhold, o único meio de concentrar uma grande quantidade de acontecimentos em um pequeno lapso de tempo, a música é ainda um elemento central do jogo na medida em que permite a montagem dos diferentes elementos que o compõem: "por exemplo, um personagem diz uma frase que marca o fim de um certo fragmento e durante este tempo uma música começa a se fazer ouvir. Este trecho musical define o início de um outro fragmento, e assim, sobre o fundo musical, vocês constroem um outro fragmento que não se parece com o precedente" (45).


O jogo musical

Nas sucessivas escolas, os Estúdios onde Meyerhold ensina, a música é uma das matérias importantes da formação do ator. Em 1908, na "Escola Musical e Dramática de V. Meyerhold", o curso de primeiro ano, comum aos músicos e aos atores, inclui para todos solfejo, piano, canto e dicção (46). Vimos o papel desempenhado pelo compositor Gnessin no Estúdio da rua Borodin. Depois da Revolução, desde 1921, no GVYTM, a música igualmente ocupa no programa um lugar central: teoria elementar, solfejo, harmonia, teoria da forma, contraponto. Há toda uma série de exercícios estabelecidos para desenvolver a acuidade auditiva dos futuros encenadores e atores: "reconhecimento rápido e distinto dos ritmos, valor dos curtos intervalos de tempo (min, s), sensibilidade aos movimentos acelerados e ralentados, medida de pequenas variações de som em altura, em tonalidade, em força, em ritmo" (47).

No final dos anos 20, no GEKTEMAS, os cursos de solfejo, o trabalho de ensaio com música, o treinamento cotidiano dos atores acompanhados pelos pianistas do teatro e a procura de cursos de "técnica do discurso" que visem tanto a precisão quanto a harmonia da fala do ator com um trabalho de pesquisa sobre as medidas, pausas, ritmos, timbres, melodias dos textos estudados (48), tudo isto permite desenvolver a musicalidade do jogo e fazer entrever a Meyerhold, em 1931, um teatro com uma nova arquitetura onde somente entrarão em jogo "o ator, a luz e a música" (49).

Como, nos espetáculos de Meyerhold, aparecia esta formação específica, como se manifesta este jogo musical? Eis alguns exemplos:

1) Construção do jogo sobre o princípio do leitmotiv. Esta repetição de um fragmento de jogo, de uma atitude, em diferentes contextos, acompanhada ou não de música, jamais é como em música um simples repetição, mas aprofundamento do tema. Assim, na comédia de N. Erdman O Mandato (1925), o motivo pantomímico do medo compõe o leitmotiv do jogo do personagem do pequeno-burguês, Pavel Guliatchkin, interpretado por Eraste Garin. Depois da frase: "Silêncio! Sou um homem do Partido.", com a qual ele acredita poder dominar toda forma de resistência no apartamento comunitário em que mora, Guliatchkin, que conseguiu amedrontar sobretudo a si mesmo, senta-se, busto inclinado, boca aberta, pupilas dilatadas, cabelos revoltos: temos aí uma exposição do medo, motor essencial desse personagem que navega entre duas épocas, entre duas classes. No segundo ato, o mesmo motivo é retomado, mas desta vez em surdina, e o tema é como que abafado por uma justificação exterior do medo. No meio do terceiro ato, é a culminação: Guliatchkin, em pé sobre a mesa, retoma a mesma pantomima agitando seu mandato misterioso e ameaçando enviar uma cópia dele ao camarada Stálin, aterrorizado por sua idéia. No final do espetáculo, desmascarado, com seu falso mandato, ele retoma a mesma pantomima antes de desaparecer atrás de sua mãe em uma posição que é o equivalente de uma morte cênica.

2) O jogo sobre o tempo, com ou sem música. Em um espetáculo como O Professor Bubu, de A. Faiko, de ritmo lento, é a relação dos fragmentos de tempo, com durações diferentes, combinando-se entre si, utilizando a pantomima apenas como material secundário, que constitui o jogo, que suscita a emoção no espectador. Okhlopkov, o intérprete do papel do General Berkovets, que foi chamado ao telefone, para criar o mal-estar, a angústia, passa de um movimento brusco que introduz uma primeira fase de jogo (8 segundos) a uma reação lenta, imóvel (ele se levanta e permanece em pé) (10 segundos) que se prolonga com uma inclinação lenta do busto (15 segundos), depois se resolve em 4 segundos com um movimento da mão (oculta em seu uniforme) e uma saída brutal (50). Os fragmentos temporais são materializados pelos fragmentos de jogo, mas é a combinação das durações que cria o impacto, que é o principal significante.

3) Jogo construído diretamente sobre uma música clássica. Sempre em O Professor Bubu, Iakhontov, intérprete do papel do barão arrivista e sem escrúpulos, em uma partitura complexa, joga com o pianista, que se detém o tempo necessário para que ele diga uma palavra que deve ser posta em relevo, canta uma frase de seu texto, marca o ritmo com sua bengala, espera o começo do próximo trecho para começar uma pantomima. Além disso, em sua direção de atores, Meyerhold procura criar um tecido de relações entre a música e os personagens, destinado a complicar um material dramatúrgico muito simples e unívoco, da mesma forma que Scriabin acentuava, aprofundava suas obras do primeiro período, quando ele mesmo as interpretava, enquanto na interpretação "thaikovskiana" de qualquer outro pianista elas pareciam ligeiras, sentimentais. O desempenho de Scriabin ao piano é para Meyerhold um modelo para o jogo do ator que trabalha sobre O Professor Bubu, com sua maneira de "jogar sabiamente com os pedais", alcançando assim timbres extremamente diferentes, com suas paradas, seus famosos ritenuto para imobilizar uma frase musical antes de um galope a uma velocidade extraordinária (51).

4) Jogo sobre o jazz. Por intermédio do poeta V. Parnakh, que volta de Paris para Moscou em 1922, trazendo instrumentos e partituras de jazz, este tipo de música fez sua entrada na U.R.S.S. sobre a cena do Teatro Meyerhold na segunda temporada de O Corno magnífico, depois em D.E. ou em Bubu. Assim, o teatro tem à sua disposição, com o jazz, uma nova música onde o som e o gesto estão ligados, na mímica do rosto e do corpo do instrumentista que freqüentemente acompanha seu desempenho com exclamações (52). Na atriz M. Babanova, isto se transforma em um método de jogo: em Bubu, por exemplo, ela acompanha com gritos agudos a melodia do espetáculo, composta de uma partitura real e de uma música "imaginária", feita do ritmo dos movimentos dos atores, da combinação da altura e da duração das réplicas: nenhum ator tem aqui uma voz "cotidiana" e o timbre-grito de Babanova é associado a gestos sincopados (gestos-golpes). Para o crítico A. Gvozdiev, a novidade do jogo de Babanova, representante da escola meyerholdiana, está na união do movimento e da palavra, movimento que informa, torna rítmica a palavra, e comunica ao espectador o conteúdo emocional do jogo não por estados de alma, mas por uma "transmissão puramente musical, dinâmica e rítmica" (53). Ele a qualifica de "Pavlova no drama" e Babanova, musicista e artista plástica, é capaz em D.E. de realizar uma cena de dança de cinco minutos sobre os estrados da orquestra de jazz ao lado do baterista.

5) A dança. Em todos os espetáculos de Meyerhold, encontramos a dança, que aliás é ensinada nos Ateliês em igualdade de condições com a biomecânica. A dança é ao mesmo tempo uma técnica e um tema, o do "baile", diversão social coletiva e representação de uma época, como nas quadrilhas do Baile de máscaras (1917) ou de O Inspetor Geral (1926). É também um meio de exprimir um estado psico-fisiológico pelo qual as emoções se revelam em um gestual mudo, com uma força intensa: dança de tutu de Babanova em O Professor Bubu, dança espanhola da prostituída em A Luta Final, encenação do grande coreógrafo O. Messerer com a atriz Tiapkina, dança de desespero do engenheiro Nunbach interpretado por Sverdlin em A Adesão... A lista é longa. É preciso demorar-se um pouco sobre as de V. Parnakh em D.E. e Bubu, onde o poeta procura realizar suas concepções coreográficas, que juntam-se às de Meyerhold, baseadas sobre uma pesquisa de danças tradicionais orientais, chinesas, malaias, persas, uma "cultura do corpo" a um só tempo uno e desarticulado, o sentido do ritmo, das síncopes, o gosto por um exotismo específico, o dos contrastes, onde o grotesco moderno poderá tomar forma, concentrará em alguns minutos toda a tragédia-bufa da época contemporânea. V. Parnakh, sobre a cena do Teatro de Meyerhold, quer criar uma dança nova, capaz de tornar-se "a epopéia do século XX" (54).


A partitura no teatro.
Entre a improvisação e o rigor científico.

Para Meyerhold, o ator é por natureza um improvisador. Ele repete isso sem cessar de 1914 a 1939. É esta sua especificidade, ela deve ser respeitada, mas este ator por seu turno deve saber respeitar a composição do espetáculo e não transformá-lo, alongando suas intervenções, em algo completamente diferente. Meyerhold falou com freqüência da ampliação dos 33 episódios de A Floresta que gradualmente precisou reduzir para 26 e depois para 16.

No final dos anos 30, Meyerhold compara o papel do encenador ao do maestro de orquestra contemporâneo que "sabe que não são somente as notas que fazem a música, mas também as pausas quase imperceptíveis que estão entre as notas. No teatro, há o sub-texto ou, se podemos falar assim, o inter-texto". De um maestro a um outro, "o fragmento temporal é o mesmo, mas a estrutura é outra: ele imprime um outro ritmo no metro. O ritmo é aquilo que domina o metro, aquilo que entra em conflito com ele. Há na arte (do bom maestro) uma liberdade rítmica no interior de um fragmento métrico. A arte do maestro está no domínio dos espaços em branco que se encontram entre os ritmos. O encenador deve saber tudo isto" (55).

Da mesma forma que o maestro interpreta uma obra, o encenador monta as estruturas dos fragmentos temporais de uma peça em um roteiro de encenação que duplica o roteiro do autor, mas o roteiro pessoal do ator também tem direito de existência: "o encenador pode limitar o ator no tempo, no espaço, e depois o ator pode fazer tudo aquilo que quiser, sob a condição de não demolir o desenho de conjunto", diz Meyerhold (56). Liberdade proclamada por ele, contestada por alguns de seus atores, mas possível porque, sem destruir O Inspetor Geral, Martinson retoma, alguns anos depois de Garin, o papel de Khlestakov, transformando a encenação do personagem, seu aspecto, seu comportamento, mas sem destruir o tecido da composição cênica onde ele se insere, e isto sob os aplausos calorosos do "Mestre".

"O ator tem uma liberdade muito grande nos limites do desenho fixado pelo encenador", afirmava Meyerhold em 1921 (57). No final dos anos 30, ele disse a Gladkov: "Tome um episódio em que se seguem um diálogo de 12 minutos, um monólogo de 1 minuto, um trio de 6 minutos, um conjunto tutti de 5 minutos, etc... Teremos as seguintes proporções: 12/1/6/5, e são elas que determinam a composição da cena dada. É preciso que as proporções sejam estritamente observadas, mas isto não limita o momento de improvisação no trabalho do ator. É justamente uma estabilidade temporal precisa que dá aos bons atores a possibilidade de fruir daquilo que constitui a natureza de seu grito. Nos limites dos 12 minutos, há a possibilidade de realizar variações e nuances na cena, de experimentar novas técnicas de jogo, de buscar novos detalhes. Proporções no interior da composição de conjunto e jogo ex improviso, tal é a nova fórmula dos espetáculos de nossa escola". E Meyerhold afirmava que, quando viesse a encontrar com o ator do futuro, idealmente musical, imaginava poder deixar espaços vazios à sua disposição para um jogo improvisado, sobre o palco, diferente a cada noite... (58).

Meyerhold sublinha portanto o parentesco do encenador e do maestro. Faz também uma analogia, conseqüência da afirmação precedente, entre o ator e o instrumento da orquestra. Também nele oscilamos entre a utopia da improvisação e a do rigor científico. O ator, que tem seu corpo como instrumento de música, segundo as palavras do biomecânico Sverdlin, reproduz com seu corpo o desenho da partitura (conf. as pantomimas de Garin em O Inspetor Geral). Sua voz é também objeto de uma orquestração. No Estúdio da rua Borodin, este problema já é levantado por Meyerhold e suas notas de curso sublinham a importância do timbre da voz (59) para o texto teatral (além da entonação e do ritmo). Há em O Corno magnífico um começo de experimentação sobre as vozes na distribuição dos papéis. Essa pesquisa prossegue em O Inspetor Geral, A desgraça de ter espírito, e nos ensaios de Boris Godunov de Puchkin (60) ele dirá aos atores: "Agora, na nova escola teatral, acabam surgindo tarefas orquestrais: a quem dar o primeiro violino, o contrabaixo, o coro? Eis um problema que somos os únicos a colocar." A redistribuição dos papéis sob o princípio do contra-papel vocal (por exemplo, baixo em vez de tenor para o tradicional papel do Primeiro Enamorado em A desgraça de ter espírito) permite também efeitos teatrais e a acentuação dos conflitos e dos motivos sociais. Enfim, como um instrumento de música, o ator deve saber jogar em solo, duo, trio, quinteto, em um jogo coletivo onde cada um está atento aos outros.

Em cena, com seus atores nos ensaios, Meyerhold é um improvisador brilhante, mas sempre dentro do quadro de um trabalho preparatório longo, vertical, minucioso, sozinho ou com o cenógrafo, com o compositor. Exemplo fabuloso: 6 anos de preparação antes de surgir O Baile de máscaras. É no trabalho sobre o palco que ele procede à instrumentação de sua "musico-encenação". Ele explica: "Eu não tenho um livro de encenação preparado com antecipação... A função do encenador é aqui absolutamente análoga à do compositor. Se venho para os ensaios com um plano estritamente preparado, só posso entretanto instrumentar minha partitura com os atores, com os instrumentos vivos de minha obra. As páginas de minhas notas de encenação assemelham-se a páginas de música, mas os sinais musicais servem de anotação" (61).

Improvisação, mas, sempre, rigor. Meyerhold é igualmente animado por uma vontade de criar uma ciência do teatro capaz de pôr fim ao diletantismo. Uma das tarefas do N.I.L., Laboratório de Pesquisas Científicas, ligado ao GOSTIM (1933-1936), é a criação de partituras de encenação sobre o modelo de partituras musicais, a elaboração de um princípio de notação teatral, abarcando o visual e o sonoro, o espaço e o tempo cênicos (62). Com métodos absolutamente artesanais, o Laboratório chegou, para A dama das camélias, ao princípio do livro-cronômetro onde, sobre a página da direita, é impresso o texto, em linhas que medem cada 6 segundos de tempo do espetáculo. Cada página comporta 10 linhas, representando portanto 1 minuto e, dividida por linhas verticais, decupa este minuto em segundos. Sob tais linhas, traçados mais ou menos longos que correspondem aos deslocamentos dos personagens (aqui, Margarida e Armando), cujo número varia segundo o das personagens, com números que remetem aos esquemas dos jogos de cena, aos gráficos da página da direita. À esquerda, a direção do movimento, sua forma, sua relação com o espaço; à direita, sua duração, sua velocidade, sua relação com o tempo e com o texto, em um esquema dinâmico em sincronia com o som do espetáculo. A página da esquerda deve conter também todos os materiais complementares: fotos ou explicações necessárias. Ao mesmo tempo, a tipografia do texto, acima ou abaixo da linha que lhe é atribuída, o caráter da impressão, a separação entre as letras, os espaços em branco devem dar as entonações, as pausas, a força da interpretação vocal (63). L. Varpakhovski, um dos principais animadores deste Laboratório, considera que os resultados do N.I.L., na ausência de suportes técnicos suficientes, permanecem bastante insatisfatórios, mas que ele entretanto colocou os princípios fundamentais da fixação de uma encenação. Sem todavia conseguir incluir a própria partitura musical em uma total correspondência com o texto e o grafismo dos deslocamentos.





A música foi igualmente um dos suportes do tema meyerholdiano anti-burguês. Nos anos 10, Meyerhold, como Doutor Dappertutto, dividia o mundo, a exemplo de Hoffmann, em duas categorias: os músicos e os não-músicos. Mais tarde, em A desgraça de ter espírito, fez de seu Tchatski, que encarna as idéias do Decembristas, um sonhador-músico interpretando em cena Mozart, Bach, Field...

Meyerhold considerava que a música devia entrar no sistema de formação do ator por ser capaz de formar o seu gosto. Assim como a freqüência às bibliotecas, aos museus e às galerias de pintura, recomendava a seus atores que fossem freqüentemente ao concerto. Em sua última e definitiva intervenção, na Conferência pan-russa dos encenadores, a 15 de junho de 1939 onde, sob a pressão ambiente, chega a renegar muito de si mesmo, não cede entretanto um centímetro em suas convicções sobre a importância da música na composição de um espetáculo e no jogo do ator.

Em torno da música, capaz de dar uma estrutura sólida ao jogo do ator, modelos de composição cênica ao encenador, e mesmo modelos de transcrição do espetáculo, em torno da música se estabelece a raiva de Meyerhold pelo fortuito e o amadorismo no teatro. Em sua busca de uma "sinfonia teatral", há uma vontade de rigor, de matematização, de auto-limitação. Magia nos anos 10, co-construção no início dos anos 20, a música permanece um quadro restritivo tanto para o encenador quanto para o autor. Esta auto-limitação do jogo, da encenação no tempo, dada pelo fundo musical em O Professor Bubu, em O Inspetor Geral, pode se desdobrar em uma auto-limitação no espaço (o pequeno praticável de O Inspetor Geral). Apesar deste princípio fundamental de não-liberdade, ou antes graças a ele, lutando contra a resistência do obstáculo, podem desabrochar a imaginação do encenador, a dos atores. Às vezes, a música pode aliviar o ator, ser um dos descansos de sua expressividade, embora exigindo-lhe um cálculo preciso, reparos precisos, um virtuosismo de instrumentista, uma flexibilidade física, uma grande leveza, uma rapidez nas mudanças de ritmo, e freqüentemente ela o transforma em dançarino. Mas sobretudo, ao conceito de auto-limitação relaciona-se, através da música, o de improvisação, que forma com ele um par indissociável. Meyerhold enuncia no final dos anos 30 esta lei do jogo do ator musical: "auto-limitação e improvisação são as duas condições principais do trabalho do ator sobre a cena. Quanto mais complexa sua associação, mais perfeita a arte do ator" (64).



O Professor Bubu.
Trechos interpretados ao piano por Lev Arntcham.

Nota: As músicas seguidas de um asterisco eram interpretadas em sua totalidade.

Iº Ato
1) Chopin, Estudo nº 12, op. 10.
2) Chopin, Estudo nº 5, op. 25.
3) Liszt, Cântico de amor.
4) Liszt, Consolação nº 1 (*).
5) Liszt, Consolação nº 3 (*).
6) Chopin, Prelúdio nº 18.
7) Liszt, Primeito Concerto.
8) Chopin, Estudo nº 8, op. 10 (*).
9) Lizst, No Lago de Mallenstadt.
10) Chopin, Estudo nº 4, op. 25 (*).
11) Liszt, Waldesrauchen (*).
12) Liszt, Valsa-Mefisto.
13) Chopin, Estudo nº 2, op. 25 (*).
14) Liszt, Consolação nº 5 (*).
15) Chopin, Estudo nº 25, op. 25 (*).

IIº Ato
1) Chopin, Estudo nº 12, op. 25 (*).
2) Liszt, Sposalizio..
3) Chopin, Estudo nº 2, op. 10 (*).
4) Liszt, A Lorelei (*).
5) Chopin, Estudo nº 6, op. 25 (*).
6) Chopin, Estudo nº 9, op. 25 (*).
7) Chopin, Estudo nº 3, op. 25 (*).
8) Chopin, Estudo nº 25 (*).
9) Chopin, Prelúdio nº 16 (*).
10) Liszt, Ganzone.
11) Liszt, Tarentella.
12) Liszt, Liebstraüme nº 2 (*).
13) Schuman-Liszt, Noite de Primavera.
14) Liszt, Liebstraüme nº 3 (*).
15) Liszt, Ganzone.

IIIº Ato
1) Liszt, Segundo uma leitura de Dante, Fantasia quasi Sonata.
2) Chopin, Prelúdio nº 21.
3) Chopin, Prelúdio nº 15.
4) Chopin, Prelúdio nº 13 (*).
5) Liszt, Funeral.
6) Chopin, Estudo nº 7, op. 25 (*).
7) Liszt, Penseroso (*).
8) Liszt, Sonetto 104 del Petrarca (*).
9) Chopin, Estudo nº 6, op. 10.
10) Chopin, Prelúdio nº 14 (*).
11) Chopin, Estudo nº 9, op. 10.
12) Liszt, Sonetto 47 del Petrarca (*).
13) Chopin, Prelúdio nº 2 (*).
14) Chopin, Prelúdio nº 24 (*).
15) Liszt, Sonetto 123 del Petrarca (*).
16) Liszt, Segundo uma leitura de Dante, Fantasia quasi sonato (*).


JAZZ.
Orquestra: piano, bateria, saxofone, violino, xilofone, organizada por V. Parnakh.
Trechos interpretados ao longo da peça: "Rose of Brasil", "O Nil", "Buddah", "Choo-choo Blues", "La Flore del Rio Grande", "Dansing of the honeymoon", "Dardanella".



Notas

1. A. Gladkov, "Meyerhold fala", Notas dos anos 34-39, O Teatro, Moscou, Iskusstvo, 1980, pág. 282. A. Gladkov anotou durante este período as palavras de Meyerhold nos ensaios, nos debates ou conversações, seguindo passo a passo o "Mestre" de quem era então secretário. [volta]
2. Exposição a 29 de outubro de 1936 perante encenadores e atores tchecos. Publicação de A. Fevralski, "V. Meyerhold em Praga", Os caminhos de desenvolvimento e as relações da arte russa e tcheca, Moscou, Nauka, 1970, pág. 140. [volta]
3. Conf. Memórias de D. Chostakovitch, Albin Michel, Paris, 1980, pág. 138. [volta]
4. Meyerhold queria montar O Jogador de Prokofiev ou Lady Macbeth do distrito de Mtsensk de Chostakovitch. Existe um plano de encenação para O Passo de aço. [volta]
5. É preciso citar ainda Glazunov e Asafiev. Chebalin foi acusado de formalismo no final do anos 30. [volta]
6. Quanto ao papel da música em O Inspetor Geral, conf. meu estudo "O Inspetor Geral de Gogol-Meyerhold", Les Voies de la création théâtrale, vol. III, CNRS, Paris, 1979, págs. 112-121. [volta]
7. Meyerhold, Écrits sur le théâtre, vol. I, L'Age d'Homme, 1973, pág. 66. As referências ulteriores à mesma edição (3 volumes editados) tomarão a forma M I, M II ou M III. [volta]
8. Reunião de artigos (1910-1911), Teatr, 1974, nº 2, pág. 32. [volta]
9. Meyerhold, "A encenação de Tristão e Isolda" no Teatro Mariinki, M I, págs. 125 e segs. [volta]
10. I. Sollertinski, "V. Meyerhold e o impressionismo no ópera russa", História do teatro soviético, vol. I, Leningrado, 1933, pág. 311. [volta]
11. "A encenação de Tristão...", M I, pág. 136. [volta]
12. Idem, p. 130. [volta]
13. Idem, p. 125. [volta]
14. Para esta citação e as seguintes, conf. "Programa de trabalho. Temporada 1914-1915", O Amor das três laranjas, 1914, nº 4-5, págs. 98-99. [volta]
15. Conf. L. Varpakhovski, Observações, análise, experiência, Moscou, 1978, VTO, pág. 107. Conf. também Meyerhold, Coletânea, Tver, 1922, pág. 27. [volta]
16. I. Sollertinski, "Meyerhold e o teatro musical", A Dama de espadas, reunião de artigos, Leningrado, 1935, pág. 41. [volta]
17. M III, pág. 180. [volta]
18. De acordo com o sistema de Dalcroze, era preciso agitar-se sobre as semicolcheias e ralentar sobre as colcheias. [volta]
19. O Professor Bubu na encenação de V. Meyerhold, Moscou, ed. T.I.M., redação de V. Ferodov, 1925, págs. 6-7. [volta]
20. Idem, p. 10. [volta]
21. A. Gvozdiev, O Professor Bubu, citado em M II, pág. 126. [volta]
22. M. Turovskaia, Babanova, lenda e biografia, Iskusstvo, Moscou, 1981, pág. 69. [volta]
23. Conf. Museu. Catálogo da exposição 5 anos, ed. Outubro Teatral, 1926, pág. 20. Divergências no interior da trupe provocam na véspera da estréia a saída de Ilinski, que desempenha o papel de Bubu, o que não modifica em nada a interpretação de conjunto. [volta]
24. Arquivos Centrais de Estado de Literatura e de Arte, Arquivos Meyerhold, Fundo 998, I, 714. A partir de agora, indicaremos apenas o número do fundo e do dossiê. [volta]
25. Conf. V. Veriguina, Recordações, Leningrado, Iskusstvo, 1974, pág. 199. Conf. também M. Gnessin, Artigos, Recordações, Moscou, 1961, págs. 84 e segs. [volta]
26. Arquivos, Fundo 963, I, 781. [volta]
27. Curso de Meyerhold na Faculdade de atores do GEKTEMAS, Arquivos, Fundo 963, I, 1341. [volta]
28. Arquivos, Fundo 998, I, 715. [volta]
29. Arquivos, Fundo 963, I, 357. [volta]
30. Encontramos por exemplo, em 1923, Gnessin ensinando junto a Meyerhold harmonia e cultura musical. [volta]
31. L. Sverdlin, Artigos, Recordações, Iskusstvo, Moscou, 1979, pág. 196. [volta]
32. Arquivos, enunciados de Meyerhold sobre a biomecânica anotados por Koreniev, Fundo 963, I, 1338. [volta]
33. Programa de trabalho da temporada 1914-1915, O Amor das três laranjas, nº 4-5, 1914, pág. 91. [volta]
34. Conf. V. Bebutov, "Inesquecível", em Herança de V. Meyerhold, Coletânea, Moscou, 1978, VTO, pág. 277. Para precisões sobre este tipo de movimento, conf. Eisenstein, Obras completas (em russo), vol. IV, pág. 81, onde ele dá definições e esquemas. [volta]
35. Testemunho de Varpakhovski, Observações, análise, experiência, op. cit., pág. 28-29. Trata-se aqui da encenação de A dama das camélias. [volta]
36. Conf. Conversa de Meyerhold com seus colaboradores para a encenação de O Inspetor Geral, 29 de dezembro de 1925, Arquivos, Fundo 998, I, 186. [volta]
37. Conf. a esse respeito a correspondência de Meyerhold com Chebalin, M III, págs. 160-166. [volta]
38. "O entreato e o tempo em cena", Herança de V. Meyerhold, op. cit., págs. 49 e segs. No final desse curso, Meyerhold falará do papel da música no melodrama como ponto de apoio para passar de uma cena a uma outra. [volta]
39. Meyerhold experimentou ele mesmo essa técnica em seu Estúdio de Petersburgo. [volta]
40. No original do texto, Arquivos, Fundo 998, I, 735, lê-se aqui "Antes Beethoven que Tchaikovski". [volta]
41. V. Meyerhold, "Sobre a turnê de Mei-Lan-Fan", 14 de abril de 1935, Herança de V. Meyerhold, op. cit., pág. 96. [volta]
42. Programa de trabalho da temporada 1914-1915, O Amor das três laranjas, nº 4-5, 1914. [volta]
43. Arquivos, Fundo 998, I, 715. [volta]
44. Conf. o curso de Meyerhold "O jogo do ator", 1922, Arquivos, Fundo 998, I, 741. [volta]
45. Curso de Meyerhold na Faculdade de atores do GEKTEMAS, 18 de janeiro de 1929, Arquivos, Fundo 963, I, 1341. [volta]
46. Arquivos, Fundo 998, I, 2855. [volta]
47. Arquivos, Fundo 998, I, 733. Há também exercícios para identificar as nuances de luz, de cor, avaliar as distâncias, desenvolver a acuidade visual com a ajuda de quadros de mestres. [volta]
48. Arquivos, Fundo 963, I, 1340. [volta]
49. Exposição de Meyerhold no Narkompros, 13 de junho de 1931, Arquivos, Fundo 998, I, 674. [volta]
50. Conf. S. Gauzner, E. Gabrilovitsh, "Retratos de atores do novo teatro", O Outubro teatral, Coletânea, Leningrado-Moscou, 1926, págs. 58 e segs. [volta]
51. Conf. estenograma de uma conversa de Meyerhold com seus atores a propósito do Professor Bubu, 18 de fevereiro de 1924, Arquivos, Fundo 998, I, 171. [volta]
52. Meyerhold sublinha também este jogo mímico acentuado no rosto e no corpo do Scriabin intérprete. [volta]
53. A. Gvozdiev, "O ritmo e o movimento do ator", Jizn Iskusstva, 1925, nº 15, págs. 6-7. [volta]
54. Conf. textos de V. Parnakh, Arquivos, Fundo 963, I, 400. [volta]
55. A. Gladkov, "Meyerhold fala", art. cit., pág. 298. [volta]
56. Idem. Esta formulação data dos anos 35-39. [volta]
57. Conf. "O entreato e o tempo em cena", art. cit., pág. 56. [volta]
58. Gladkov, "Meyerhold fala", art. cit., págs. 298-299, e depois pág. 280. [volta]
59. Arquivos, Fundo 998, I, 714. [volta]
60. Encenação inacabada, já preparada em 1918, depois retomada em 1925-1926 com o Terceiro Estúdio do Teatro de Arte. Ela retorna enfim em 1936. [volta]
61. "Exposição a 29 de novembro de 1936 perante encenadores e atores tchecos", art. cit., pág. 139. [volta]
62. Em 1925-1926, N. Ivanov no GOSTIM já realiza uma pesquisa semelhante e inventa um sistema de notação em pautas de 5 linhas. [volta]
63. Conf. L. Varpakhovski, "A partitura de um espetáculo", Teatr, 1973, nº 11, págs. 88 e segs. Além desta pesquisa, o NIL estuda o discurso, sua melodia, seu tempo, seus ritmos, sua fluidez, suas rupturas, seus silêncios. [volta]
64. A. Gladkov, "Meyerhold fala", art. cit., pág. 317. [volta]


In Le jeu de l'actor chez Meyerhold et Vakhtangov, Laboratoires d'études theatrales de l'Université de Haute Bretagne, Études & Documents, T. III, Paris, 1989, págs. 35-56. Tradução de Roberto Mallet.


Os Caminhos para Senhora


“Não admito censura nem de Jesus Cristo.”
Nelson Rodrigues

Senhora dos Afogados é a quinta peça de Nelson Rodrigues. Foi escrita numa fase em que o autor buscava abordar nas suas peças temas míticos, como ocorreu com as que a precederam: Anjo Negro e Álbum de Família, e também Dorotéia, que a sucedeu. Escrita em 1947, foi censurada e interditada pela justiça e só liberada em 1953. Após a liberação chegou a ser ensaiada pelo TBC, sob a direção de Ziembinski, mas foi rejeitada após duas semanas de ensaios. Em 1954 foi montada no Teatro Municipal sob a direção de Bibi Ferreira com Nathália Timberg e Sônia Oiticica nos papéis principais. A primeira apresentação foi marcada por vaias e aplausos. Ao final da peça, parte do teatro gritava “Gênio!” e outra parte “Tarado!”, até que Nelson subiu ao palco e complicou mais as coisas gritando “Burros! Burros!” Ao final da confusão, Nelson confessou a Nathália Timberg sua insatisfação: “A estrela está no céu. Quem não vê, não vê. Mas ela brilha do mesmo jeito.”*1

Nelson Rodrigues passou pelo teatro brasileiro como uma espécie de tsunami. Provocativo, demolidor, obcecado, despertou cóleras terríveis e admirações enlevadas, tal como se a realidade, por alguns momentos, se transformasse numa cena de suas próprias peças. Dentro desse clima meio surrealista, o público vaiava com furor ou aplaudia. A censura fazia a sua função, proibindo sete de suas peças. Nunca se havia visto nada semelhante na história do teatro brasileiro.

Ainda hoje esta trama criada por Nelson Rodrigues está impregnada em suas filigranas de elementos que podem estar presentes em qualquer camada social de nossas sociedades. A saga da família Drummond fala além de seus acontecimentos, ela mostra um retrato de onde pode chegar a condição humana, diante dos seus desejos e obsessões.

A própria excelência da obra de Nelson Rodrigues e a importância de sua produção dramática para o teatro brasileiro são fatores em si só justificáveis para a realização desta montagem. Em 2010, comemora-se 30 anos de sua morte, momento este em que as homenagens são mais que justas e imprescindíveis. É a segunda vez que a Cênicas Cia de Repertório visita os clássicos, em 2006 foi realizada a premiada montagem de As Criadas de Jean Genet em homenagem aos 20 anos da morte do autor. A montagem desse grande autor pernambucano será o início das homenagens em torno desta data comemorativa. O amadurecimento técnico e artístico de uma companhia se dá neste experimentar teórica e praticamente seu ofício, desenvolvendo novas aptidões e novas possibilidades através de procedimentos de encenação diversos.

Em si tratando de Senhora dos Afogados, Recife presenciou uma grande montagem em 1993, pela Cia. Teatro de Seraphim e sob a direção de Antônio Cadengue, que revolucionou a cena do teatro nordestino e arrebatou crítica e público em Portugal. Revisitar este momento histórico através de mais uma leitura deste texto, após quase 20 anos, é potencializar as antigas relações existentes entre este autor pernambucano/carioca e os artistas do Recife que sistematicamente mergulham profundamente com a obra visceral e de alto teor conceitual do autor, colocando o espectador diante da crueldade inerente à condição humana e que por mais inimagináveis que possam parecer, são coisas que permeiam nossas vidas.
*1Ruy Castro. O Anjo Pornográfico, Companhia das Letras, São Paulo, 1992. p. 254