quinta-feira, 4 de agosto de 2011
quinta-feira, 13 de janeiro de 2011
teatro de estados de alma
Voltaire escreveu em algum lugar: "o segredo de ser chato é dizer tudo".
Pode-se dizer o mesmo do encenador.
Mas o encenador do Teatro de Arte mostrou como se pode destruir a harmonia desse ato. Ele fez da cena de prestidigitação uma cena inteira, com todos os seus detalhes e todos os seus truques, longa e complicada. Concentrando nela sua atenção, o espectador perde de vista o leitmotiv do ato. E se no final do ato as melodias de fundo permanecem na memória, o leitmotiv, enterrado pela encenação, extinguiu-se.
Em O Cerejal, como nos dramas de Maeterlinck, há um herói que não está em cena, mas cuja presença sentimos cada vez que cai o pano. Mas quando o pano que cai sobre O Cerejal é o do Teatro de Arte de Moscou, a presença desse herói não se faz sentir. Não permanece em nossa memória nada além de tipos. Aos olhos de Tchekhov, as personagens de O Cerejal são mais um meio do que um fim. Mas no Teatro de Arte as personagens tornam-se o essencial, e é assim que não se revela nada de todo o aspecto lírico-místico da peça.
Nas peças de Tchekhov, o particular desvia o encenador da imagem de conjunto, pois os personagens, esboçados de maneira impressionista, constituem um material aberto, que pode ser aproveitado para levar o traçado até seu acabamento em figuras brilhantes (tipos). Mas no caso de Ibsen, no dizer do encenador naturalista, é necessário explicá-lo ao público, pois o dramaturgo não lhe é suficientemente compreensível.
Em primeiro lugar, a encenação da dramaturgia ibseniana tenta a seguinte experiência: tornar vivos os diálogos "tediosos" movimentando-os - as personagens comem, limpam a sala, fazem as malas, embrulham sanduíches, etc... Em Hedda Gabler (16), durante a cena entre Tesman e a tia Julie, era servido o desjejum. Recordo muito bem da elegância com que o intérprete do papel de Tesman comia, mas infelizmente isso me impediu de acompanhar toda a exposição da peça.
Nas peças de Ibsen, além do desenho preciso de "tipos" do universo norueguês, o encenador empenha-se em sublinhar todos os diálogos que acha muito complicados. E se esquece que a essência de um drama de Ibsen, como As Colunas da Sociedade (17), acaba completamente sufocada por um trabalho analítico excessivo nas cenas de transição. Quanto ao espectador que leu a peça e a conhece bem, ele vê no teatro uma outra peça, que não compreende, por que ela não corresponde à que ele leu. O encenador colocou em primeiro plano muitas cenas secundárias, e fez delas o essencial. Mas a essência da peça não se reduz à soma das essências das cenas secundárias. Mesmo sem ser suficientemente salientado, um único momento fundamental em um ato é decisivo sobre o espírito do público, mesmo que todo o resto tenha deslizado à sua frente como em um nevoeiro.
A ambição de mostrar tudo, custe o que custar, o medo do mistério, das meias-palavras, fez do teatro uma simples ilustração do texto do autor.
"Novamente ouço o uivo de um cão", diz uma personagem. E fatalmente o uivo do cão é reproduzido. O espectador sabe da partida não somente pelo ruído dos guizos que se distanciam, mas também pelo barulho dos cascos dos cavalos sobre uma ponte de madeira que atravessa o riacho. Ouve-se o ruído da chuva sobre um teto de ferro. Ouve-se pássaros, rãs, grilos.
Eis, a esse respeito, uma conversa que A. P. Tchekhov teve com os atores (18). Ele assiste pela segunda vez aos ensaios de A Gaivota (11 de setembro de 1898) no Teatro de Arte de Moscou, e um dos atores lhe conta que nessa peça, fora de cena, rãs coaxarão, cigarras cantarão e cachorros latirão.
- Por que tudo isso? - pergunta Anton Pavlovitch com um ar descontente.
- Isso a torna real - responde o ator.
- Isso a torna real - repete A. P. com um sorriso irônico. E acrescenta, depois de uma pequena pausa: - A cena pertence à arte. Kramskoi (19) representou rostos magnificamente, em sua pintura de costumes. Que aconteceria se, em um desses rostos, retirássemos o nariz pintado para substituí-lo por um verdadeiro? O nariz seria real, mas o quadro estaria destruído.
Um dos atores conta com muito orgulho que, no final do terceiro ato de A Gaivota, o encenador quer colocar sobre o palco toda a criadagem, notadamente uma mulher com o filho chorando.
Anton Pavlovitch, então:
- Não é preciso. É como se, no momento em que você toca uma passagem pianissimo, caísse a tampa do piano.
- Na vida, freqüentemente acontece que, em um pianissimo, irrompa um forte totalmente inesperado - tenta a defesa um dos atores do grupo.
- Sim, mas a cena - diz A. P. - exige uma certa convenção. Você não tem a quarta parede. Além do mais, a cena pertence à arte, a cena reflete a quintessência da vida, e não se deve colocar nela nada de supérfluo.
É necessário precisar a que ponto, nessas observações, o próprio A. P. Tchekhov deixa transparecer sua condenação do teatro naturalista? Esse teatro procurou infatigavelmente a quarta parede, e isso o conduziu a toda uma série de absurdos.
Esse teatro tornou-se tributário de seus ateliês: desejou que tudo em cena seja "como na vida", e isso fez com que ele se transformasse em uma vitrina de objetos de museu.
Na fé que dedicavam às palavras de Stanislavski - o céu teatral pode uma vez ou outra parecer verdadeiro ao público -, os diretores de teatro passaram a ter como principal e dolorosa preocupação elevar o máximo possível o teto da cena.
E ninguém percebe que em vez de fazer uma modificação tão custosa dos palcos, melhor seria romper com o princípio de base do teatro naturalista. Foi somente esse princípio, e apenas ele, que levou o teatro a uma série de absurdos.
É difícil acreditar que é o vento, e não uma mão nos bastidores, que balança a grinalda no primeiro quadro de Júlio César, uma vez que os mantos das personagens permanecem imóveis.
No segundo ato de O Cerejal, as personagens saem por barrancos "verdadeiros", atravessam pontes "verdadeiras", encontram-se junto a uma capela "verdadeira", mas ao mesmo tempo caem do urdimento dois grandes pedaços de tela pintados de azul, ornados de véus de tule, que de maneira nenhuma poderiam assemelhar-se a um céu, nem a nuvens. Está certo que as colinas no campo de batalha (em Júlio César) sejam colocadas de tal maneira que pareçam diminuir progressivamente em direção ao horizonte; mas por que então as personagens que se distanciam na mesma direção não diminuem também?
"Tal como é usualmente admitida, a cena coloca perante o espectador uma paisagem em profundidade sem no entanto ser capaz de ajustar o corpo das personagens a esse fundos distantes. Mas isso não impede que uma tal cena pretenda reproduzir fielmente a natureza! O ator que se distancia da boca de cena e percorre dez ou mesmo vinte metros parece sempre do mesmo tamanho, e é visto com a mesma precisão com que o víamos no proscênio. E entretanto, de acordo com as leis da perspectiva aplicadas pela pintura cenográfica, seria preciso fazer o ator recuar o mais longe possível, e, caso se queira que ele apareça verdadeiramente proporcionado às árvores, às casas, às montanhas que o rodeiam, ele deveria ser mostrado bem menor, às vezes como uma silhueta, às vezes reduzido a um simples ponto." (20)
Uma árvore verdadeira parece grosseira e artificial ao lado de uma árvore pintada, pois suas três dimensões introduzem uma desarmonia junto à pintura, que só possui duas.
Desses absurdos a que levou o teatro naturalista ao tomar por fundamento o princípio da reprodução exata da natureza, poderíamos dar ainda muitos exemplos.
Conhecer o aspecto racional de um objeto, fotografar, ilustrar o texto de uma obra dramática com a pintura cenográfica, copiar o estilo histórico, tudo isso tornou-se o objetivo fundamental desse gênero de teatro.
Se o naturalismo levou o teatro russo a uma complicação da técnica, o teatro de Tchekhov, a outra face do Teatro de Arte, revelou o poder dos estados de alma sobre a cena, e criou algo sem o que o teatro dos Meininger já teria desaparecido há muito tempo. Mas, paralelamente, o teatro naturalista não soube, no interesse de seu desenvolvimento futuro, tirar vantagem desse novo tom que a música tcheckoviana lhe trouxe. O teatro de estados de alma foi sugerido pela arte de A. P. Tchekhov. Quando montou A Gaivota, o teatro Alexandrinski não compreendeu esse estado de alma que o autor sugeria (21). E seu segredo não estava nem nos gritos dos grilos, nem nos latidos dos cães, nem nas portas verdadeiras. Quando A Gaivota foi montada pelo Teatro de Arte no local do Ermitage (22), a maquinaria não estava ainda muito aperfeiçoada, e a técnica ainda não havia estendido seus tentáculos por todos os recantos do palco.
O segredo dos estados de alma tchekhovianos reside no ritmo de sua linguagem. E esse ritmo foi compreendido pelos atores do Teatro de Arte durante os ensaios da primeira encenação tchekhoviana. E ele foi compreendido graças ao amor que ele dedicavam ao autor de A Gaivota.
Se o Teatro de Arte não tivesse escutado o ritmo das obras tchekhovianas, se não tivesse sabido recriar esse ritmo em cena, jamais teria adquirido essa segunda face que lhe deu a reputação de teatro de estados de alma; e essa era a sua própria face, e não mais uma máscara emprestada aos Meininger.
Estou profundamente convencido de que essa circunstância, que permitiu ao Teatro de Arte abrigar sob o mesmo teto o teatro naturalista e o teatro de estados de alma, foi o próprio Tchekhov que contribuiu para criá-la, precisamente porque ele assistia aos ensaios de suas peças e, através do encanto de sua personalidade e das freqüentes conversações que tinha privadamente com os atores, influenciou seus gostos e suas atitudes em relação aos problemas estéticos.
O teatro deve essa nova face a um grupo bem preciso de atores, que aliás eram chamados de "atores tchekhovianos" (23). Era esse grupo, intérprete quase invariável de todas as peças de Tchekhov, que detinha a chave de sua interpretação. E devemos considerar esses atores como os criadores do ritmo tchekhoviano sobre a cena. Cada vez que recordo da participação ativa dos atores do Teatro de Arte na criação das personagens e dos estados de alma de A Gaivota, compreendo como pude começar a crer profundamente no ator enquanto agente fundamental da cena. Nem a encenação de detalhes, nem os grilos, nem o barulho dos cascos de cavalo sobre a ponte, nada disso cria o estado de alma; somente a musicalidade excepcional dos intérpretes que compreenderam o ritmo da poesia tchekhoviana e que souberam envolver suas criações com um halo lunar.
A harmonia não foi destruída nas duas primeiras encenações (A Gaivota e Tio Vânia (24)), já que a arte dos atores permaneceu totalmente livre. Depois, o encenador naturalista passa a fazer do conjunto uma essência, e acaba perdendo a chave da interpretação de Tchekhov.
A arte de cada um dos atores tornou-se passiva, pois o conjunto tornou-se a essência; o encenador, reservando-se o papel de maestro, influiu fortemente sobre o destino do novo tom e, em lugar de aprofundá-lo, em lugar de penetrar na essência do lirismo, o encenador naturalista pretendeu criar o estado de alma pelo refinamento de procedimentos formais tais como a penumbra, ruídos, acessórios, caracteres.
Mas, depois de ter compreendido o ritmo do discurso, o encenador logo perdeu as chaves da sinfonia (terceiro ato de O Cerejal), porque não notou que Tchekhov tinha passado de um realismo refinado a um lirismo aprofundado e à nuança mística.
Munido da chave de interpretação das peças de Tchekhov, o teatro vê nela um modelo, que se põe a aplicar a outros autores. Interpreta Ibsen e Maeterlinck à Tchekhov.
Já vimos de que maneira esse teatro tratou Ibsen. Quanto a Maeterlinck, não foi abordado através da música de Tchekhov, mas sempre com a mesma técnica de racionalização. As personagens de Os Cegos eram divididas em caracteres, e, n'A Intrusa (25), a Morte aparecia sob a forma de uma nuvem de tule.
Tudo era muito complicado, como é regra no teatro naturalista, e nada era convencional, enquanto tudo é justamente convenção nas peças de Maeterlinck.
O Teatro de Arte poderia ter saído desse impasse e ter se orientado para o novo teatro utilizando-se do talento lírico de Tchekhov, o músico; mas, depois, escolheu subordinar sua música à técnica e aos diferentes truques, e, no final de sua atividade, perdeu a chave de interpretação de seu próprio autor, como os alemães perderam a da interpretação de Hauptmann, que, rodeado de peças de costumes, pôs-se a criar peças que exigiam uma abordagem completamente diversa, como Schluck e Jau e Pippa danse.
Notas
* Este artigo foi escrito em 1906, e publicado posteriormente como parte do primeiro capítulo do livro Do Teatro (Petersburgo, edições Prosvechtchenie, 1913). As notas ao texto são do próprio Meyerhold e de Beatrice Picon-Vallin, a tradutora francesa do mesmo (identificadas respectivamente pelas siglas N.M. e N.T.F.). (Nota da Tradução Brasileira) [volta]
(1) Repertório: Os Homens livres de Pisemski, O Carreteiro Henschel de Hauptmann, As Paredes de Naidenov, Os Filhos do Sol de Gorki. (N.M.) [volta]
(2) Jan Styka (1858-1925). Pintor, poeta e escritor de origem polonesa. Consagrou-se sobretudo a temas religiosos e de gênero. Tenta, em seus "panoramas", realizar uma fusão entre a pintura de fundo e o plano que comporta os objetos, no qual introduz também a silhueta humana. É amigo pessoal de L. N. Tolstói, com quem mantém uma correspondência regular. Suas obras encontram-se nos museus poloneses (Varsóvia, Poznan). (N.T.F.) [volta]
(3) A estréia de Júlio César de Shakespeare no Teatro de Arte foi a 2 de outubro de 1903. (N.T.F.) [volta]
(4) Schopenhauer. (N.M.) [volta]
(5) O drama de Ibsen Casa de Bonecas foi montado no Teatro Komissarjevskaia em uma encenação de A. P. Petrovski, a 17 de setembro de 1904. Em 18 de dezembro de 1906, esse espetáculo voltou a cartaz em uma encenação de Meyerhold. (N.T.F.) [volta]
(6) Schopenhauer. (N.M.) [volta]
(7) Montada pelo Teatro de Arte de Moscou. (N.M.) [volta]
(8) A Gaivota foi remontada pelo Teatro de Arte em 1905. Meyerhold representou por algum tempo o papel de Treplev. (N.T.F.) [volta]
(9) Schopenhauer. (N.M.) [volta]
(10) Schopenhauer. (N.M.) [volta]
(11) L. N. Tolstói, Shakespeare e o drama. (N.M.) [volta]
(12) A. Pope (1688-1744). Poeta inglês. Em seu Essay on criticism (1711), faz uma espécie de manifesto do classicismo inglês, cujos princípios serão em parte aplicados em sua obra Windsor forest (1713). (N.T.F.) [volta]
(13) Esta é a primeira aparição de um tema que será particularmente caro a Meyerhold depois da Revolução: é preciso cronometrar com precisão a duração das diversas cenas sobre o palco, e mesmo as pausas. Constantemente ele chamará a atenção dos atores no sentido de não deixar que certas cenas se arrastem, à medida em que se sucedem as representações. O tempo, o ritmo, constituem um quadro, no qual deve se desenvolver a ação do ator, que jamais deve exceder os limites dessa estrutura. (N.T.F.) [volta]
(14) A estréia de O Cerejal no Teatro de Arte, na encenação de Stanislavski e Nemirovitch-Dantchenko, foi em 17 de janeiro de 1904. (N.T.F.) [volta]
(15) Encontramos em O Cerejal outras notas idênticas, dissonantes e fugitivas, que, provindas do fundo, irrompem no leitmotiv do ato: a leitura dos versos pelo chefe da gare, a cena do taco de bilhar quebrado por Epikhodov, da queda de Trofimov nas escadas. E podemos ver, neste outro exemplo, como Tchekhov entrelaça fina e estreitamente essas duas melodias, o leitmotiv e o fundo:
Ania (com angústia): E agora, no cozinha, um homem disse que "O Cerejal" já foi vendido, hoje.
Liubov Andreievna: Vendido para quem?
Ania: Ele não disse para quem; ele se foi. (Ela dança com Trofimov.)
(N.M.) [volta]
(16) Hedda Gabler de Ibsen foi montada pelo Teatro de Arte em fevereiro de 1899. Oito anos mais tarde, Meyerhold dará sua interpretação de Hedda Gabler, em oposição à do Teatro de Arte. Meyerhold achava entretanto que Stanislavski era excelente no papel de Levborg, e é a recordação de sua interpretação que está na base do artigo de Meyerhold e Biebutov A Solidão de Stanislavski, publicado na primavera de 1921 em Vestnik Teatra (O Mensageiro teatral). Nesse artigo, a natureza teatral de Stanislavski é sublinhada. (N.T.F.) [volta]
(17) As Colunas da sociedade foi montada no Teatro de Arte em fevereiro de 1903. (N.T.F.) [volta]
(18) Retirado de meu Diário. (N.M.) [volta]
(19) I. N. Kramskoi (1837-1887). Começa como retocador de um fotógrafo ambulante. Em 1857, na Academia de Artes de Petersburgo, combate os métodos acadêmicos de pintura e em 1863 "fecha a porta" da Academia. Passa então a animar uma "comuna de pintores", que quer promover os métodos realistas, com temas contemporâneos. Quando a "Comuna" curva-se a compromissos com a pintura acadêmica, Kramskoi a abandona, e participa na formação do grupo dos Peredvijniki (originalmente uma confraria de pintores que organizavam exposições ambulantes). É o mestre do retrato realista. (N.T.F.) [volta]
(20) G. Fuchs, Die Schaubühne der Zukunft (A Cena do Futuro), pág. 28. (N.M.) [volta]
(21) A Gaivota foi montada pela primeira vez no Teatro Alexandrinski (estréia a 17 de outubro de 1896), mas esse teatro não tinha compreendido o caráter novo da peça, e o espetáculo foi um fracasso. (N.T.F.) [volta]
(22) Durante as quatro primeiras temporadas (1898-1902), ou seja, durante os anos em que Meyerhold representava, o Teatro de Arte de Moscou ainda não tinha um local definitivo, e apresentava-se na sala do Teatro Ermitage. (N.T.F.) [volta]
(23) Por "ator tchekhoviano" Meyerhold entende o grupo de atores que interpreta todos os primeiros espetáculos de Tchekhov: Knipper, Lilina, Stanislavski, Artiom, Katchalov. (N.T.F.) [volta]
(24) A estréia de Tio Vânia no Teatro de Arte foi a 26 de outubro de 1899. (N.T.F.) [volta]
(25) O Teatro de Arte apresenta em uma só noite três peças de Maeterlinck, entre as quais Os Cegos e A Intrusa (estréia em 2 de outubro de 1904). (N.T.F.) [volta]
In "Écrits sur le Théâtre", Tome I, La Cité - L'Age d'Homme, tradução de Beatrice Picon-Vallin, Lausanne, pág. 95-104. Tradução de Roberto Mallet.
terça-feira, 28 de setembro de 2010
Mudança de Horários Teatro ***Senhora dos Afogados*** - Semana das eleições
sábado, 25 de setembro de 2010
Estreia HOJE *** Senhora dos Afogados *** no Teatro Hemilo Borba Filho as 21h
Com esta montagem iniciamos a comemoração dos 10 anos do Grupo Cênicas Cia de Repertório que se dará em 2011. Estamos crescendo, adquirindo a nossa personalidade. Convivemos e superamos dificuldades. Senhora dos Afogados, obra de peso e magnitude, um desafio. Sabíamos!
Lidamos com o novo, com uma direção a distancia; minuciosa; exigente. Uma assistência competentíssima que nos trouxe segurança, continuando e acrescentando ao trabalho do encenador. Trabalhamos duro, acumulamos funções. Trabalhamos, choramos, suamos, caímos e levantamo-nos.
Nosso fruto está pronto para colhermos. Sorrimos...
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
Nelson de volta aos palcos pernambucanos
Encenar “Senhora dos Afogados” no Recife, minha terra natal (e de
Nelson Rodrigues) foi uma possibilidade de retornar ao ambiente onde
comecei a fazer teatro, após dez anos de distância. Foi o momento
ideal, pois com esta realização comemoro meus 20 anos de carreira,
iniciada no SESC-Santo Amaro, no dia 10 de março de 1990.
De lá para cá, muitas águas rolaram e muita coisa mudou em se tratando
de teatro. Mas a força poética de Nelson Rodrigues e o estupor causado
pela sua forma de abordar certos temas parece continuar a mesma.
“Senhora dos Afogados” é um de seus textos mais poéticos, contundentes
e difíceis em termos de encenação teatral. Para os atores também, pois
é preciso trabalhar em cima de sutilezas, de nuances, de verdade
interior.
O convite da Cênicas Cia. de Repertório foi para um projeto maior que
uma montagem. A proposta era que a criação e o processo de um
espetáculo servisse como um processo de formação de atores. Através de
técnicas específicas de atuação focadas nas ações físicas, encaminhei
os atores a um tipo de interpretação que fundamentaria a criação e
relação das personagens rodriguianas.
O texto de Nelson Rodrigues sugere uma composição, tanto em termos
cênicos como interpretativos, que oscila entre uma mobilidade pulsante
de personagens e imagens, como em movimentos muitos precisos e
concatenados.
Nelson também deixa evidente esta análise crítica das diferenças
sociais existentes não só no Brasil, mas em todas as partes do mundo,
como atuantes diretas de um conflito nodal da existência humana. Não é
a toa que o autor se utiliza das máscaras em seus coros, recurso
metateatral e ao mesmo tempo revelador de sutilezas entre claro e
escuro, entre simulacro e revelação, símbolo máximo das relações
sociais e psíquicas que compõem o ser coletivizado.
Érico José
domingo, 19 de setembro de 2010
quinta-feira, 26 de agosto de 2010
Foto Luciana Dantas
A Renascer Produções Culturais organiza o Seminário Internacional de Crítica Teatral desde 2005 evento que reúne estudantes, profissionais e estudiosos de diferentes formações acadêmicas em um compartilhar de experiência, opinião e conhecimento dos mais diversos países, com o propósito maior de fazer avançar o desenvolvimento do discurso crítico sobre a criação teatral, em todo o mundo. O exercício da crítica de teatro como disciplina e a contribuição para o desenvolvimento das suas bases metodológicas constituem, assim, a prática do Seminário Internacional de Crítica Teatral, levada a cabo por críticos do teatro e uma gama de especialistas nas áreas de conhecimento que entrecruzam comunicação, história, filosofia, arte, literatura e teoria teatral, dentre outras. Nesta edição teremos uma mostra de espetáculos como tema-conceito Sexualidade(s) em Performance, com o objetivo maior de promover a instalação do diálogo crítico. Para tanto, contaremos com a participação de quatro críticos; cada um deles escreverá sobre os espetáculos, produzindo um painel sobre a produção teatral pernambucana presente na Mostra.
http://seminariocriticateatral.blogspot.com/2010/08/painel-critico-senhora-dos-afogados.html
Painel Crítico / Senhora dos Afogados (Espetáculo em processo)
Senhora a caminho
Kil Abreu
Senhora dos afogados, de meados dos anos 40, explica com objetividade por que Nelson Rodrigues foi alçado pela nossa crítica ao posto de dramaturgo central do modernismo brasileiro. É que a geração de Décio de Almeida Prado e Sábato Magaldi, que se notabilizaria por um embate ferrenho contra as velhas formas do teatro ligeiro vindas do século XIX, via no autor a possibilidade de síntese de um projeto estético para a cena que se firmaria, de fato, nas décadas seguintes. Se comparado à experiência européia tratava-se de um projeto de modernização conservadora. É que a crítica olhara para as nossas experiências vanguardistas valorando-as, ao menos em um primeiro momento, para baixo, mesmo que muitas delas tenham sido formalmente bem mais complexas no filtro da sociabilidade brasileira que as peças de Nelson (pensemos em Oswald Andrade). Basta ler, ainda hoje, as considerações de Barbara Heliodora sobre a montagem de O Rei da vela, pela Cia. dos atores, “criação de exceção” julgada teatralmente inviável. Oswald continua não cabendo nos escaninhos. Mas, há, claro, o fato de que Nelson tem obra mais lata e repercutiu oferecendo à cena a justa medida de assimilação esperada: reformista, ainda que não revolucionária.
Na montagem que a Cênica Cia de teatro prepara agora é o tema da Electra que rege a trama. Em uma república de assassinos (praticamente todos os personagens centrais), o fator de destino e determinação social é a tradição (trata-se de uma família de “trezentos anos” e de uma linhagem de mulheres supostamente puras e castas) e o elemento de danação é o apetite pelo incesto ou pela traição. Nele podemos ver o frescor da novidade moderna primeiro na tonalidade expressionista. Mais tarde isto se estenderia, na obra de Nelson, em outras versões brasileiras, em tema e linguagem, da tragédia, que aqui se aclimatou em um pacto de convivência negociado nos terrenos para nós acidentados do drama, envernizado com o sotaque local e sobre a base de argumentos e situações escandalosas, em uma arte de composição poética que, como sabemos, faz história.
Quanto à montagem sob a encenação de Erico José, as cenas que vimos alcançam até um pedaço do segundo ato e dizem de um processo em pleno andamento. Então as notas que seguem têm esta intenção também provisória, a partir do chão relativamente já firme que o grupo demarcou. Dado isto, não vamos entrar no mérito de questões específicas de desempenho e acabamento. Vou direto a uma ou duas questões gerais que talvez interessem.
A tomar pelas falas do grupo depois do ensaio, em que se disse sobre o processo de apropriação e abandono de alguns aspectos do treinamento, a Cênicas já intuiu a partir dos seus tateares na biomecânica meyerholdiana que os meios não podem ser os fins. Se por um lado a forma é ela mesma o conteúdo, por outro o processo formativo, os procedimentos de criação através dos quais a forma “se” forma, estes precisam ser alimentados por propósitos, intuições, diálogos com o mundo. É esta percepção da prática criativa já manifestada pela equipe - que não deve estar submetida ao encantamento provocado pela dramaturgia (a ponto de apenas ser reverente a ela), nem tampouco à afinação dos meios expressivos -, é esta percepção que, supomos, pede ainda mais espaço no trabalho de formalização do espetáculo.
Pelo relato do elenco parece claro o entendimento de que a técnica sozinha diria pouco. E dificilmente – a não ser que alcançasse um grau de virtuosismo extra-ordinário – deixaria de ser engolida por uma dramaturgia tão berrante e de contornos tão fortes quanto esta. Por isso, sem demérito ao ponto em que chegou a Cia, causa muito interesse o plano apresentado para o terceiro ato. Pelo que pudemos entender há ali uma promessa de autonomia poética maior, com o uso de elementos novos, segundo o que foi anunciado. O importante é que ao que parece não se trata de mero esteticismo. Esperemos que não. É que estão mesmo ali, no último quarto da ação, as razões que justificariam esta “virada” formal. É quando Misael, D. Eduarda, sua prole e vizinhança esquisitas assumem o despudor que se avoluma até o paroxismo, explodindo os desejos interditados na deleitosa aniquilação – coletiva - da norma em favor do desejo. Será difícil, portanto, manter o metro parnasiano que a encenação usa até aqui. Para benefício da verossimilhança a peça pede um descomedimento que também pode ser a senha para uma entrada mais autoral do grupo frente a Nelson, em uma conversa não reverente, mas pautada pela vontade de um diálogo verdadeiro entre artistas. E aí será útil pensar que em arte, assim como na vida, um diálogo franco não pode ter duas medidas de poder.
Salvo engano o espetáculo tende, então, a ser mais interessante quanto maior for a possibilidade de a Cênicas Cia. firmar sua voz própria. Há já um mais que razoável domínio dos meios, com a vigilância e o olhar rigoroso do encenador Erico José para a eficácia dos treinamentos que foram propostos. Isto não é pouco. Para além da montagem é coisa que sinaliza um tipo de procedimento de trabalho importante e parece que não muito usual no Recife. Mas, também não é tudo. Dominado o essencial do repertório é preciso que a morfologia vire sintaxe, que se articule em um discurso mais firme. Daí poderemos falar em linguagem. Não exatamente uma linguagem modelar, já escrita. Talvez uma linguagem nova, se necessário. E uma linguagem, a não ser que ela seja puro jogo formal – o que também seria legítimo, mas não parece ser este o caso - se institui em ponte com o mundo. Não apenas o mundo original e convidativo da peça, mas, sobretudo, a vida ordinária que estará pulsando, selvagem e atenta, no momento em que o pessoal da Cênicas pisar o palco para enfrentar Nelson.
Na percepção deste crítico o desafio não deveria dispensar, pois, a mediação do real e do presente. O discurso sobre a “universalidade” do texto, a “atemporalidade” poética da condição humana ou a sua carga “arquetípica” é algo que deve ficar para a platéia. Para o artista são clichês que não operacionalizam muita coisa. Desconfio que no fundo nem Antunes Filho precisou deles para as suas versões essencialistas e geniais, como em Nelson Rodrigues, o eterno retorno e Paraíso, Zona Norte. Estas coisas todas, se tomadas como princípio regente das tarefas de trabalho, de qualquer maneira não deveriam absolver a necessidade de leitura da peça, que de todo modo permanece lá. A questão é que aqui, como na criação em geral, será preciso antes de encontrar a esfinge inventar as perguntas que vão pautar aquele diálogo. Neste momento ele se apresenta nas bases de uma abordagem cuidadosa. Aguardemos para ver com quais inquietações ele se arredonda. Retomando o início, já sabemos que Nelson é o maior. Mas, o que interessa agora é saber sobre a maioridade da Cênicas Cia.
Senhora dos Afogados – Apontamentos críticos para um ensaio
Paulo Bio Toledo
(Obs.: Edição coletiva do texto com Juliene Codognotto em operação semelhante aos processos de colaboração e edição de textos na revista Bacante – www.bacante.com.br)
0. Ontem, antes de começarmos a assistir Senhora dos Afogados, fomos avisados de que aquilo era um ensaio. Paradoxalmente, o ambiente sóbrio e simples do ensaio pode deflagrar elementos muito interessantes. No caso, a composição simplificada (luz geral, figurinos neutros, aquecimento aos olhos do público, etc.) coloca em evidência algo muitas vezes esquecido no teatro, a saber, sua característica de troca, razão e pensamento ao invés do deslumbre, efeitos, beleza e contemplação. No ensaio de Senhora dos Afogados, projeta-se ao primeiro plano a dramaturgia e as escolhas técnicas de encenação e interpretação e, consequentemente, a apreensão cognitiva das mesmas – justamente por assumir seus elementos de ‘ensaio’. (não é possível saber como será a peça quando pronta... Mas muito dessa ambientação simplificada e despida de ilusões faz bastante bem ao espetáculo. E ao teatro, diga-se de passagem)
1. O que primeiro ressalta do esboço apresentado é a concepção coral dos “Vizinhos”. Sua construção é um passo além ao próprio texto de Nelson Rodrigues, pois ao conjugar todas as vozes dos vizinhos numa única aglutinação coral, os vizinhos, invariavelmente, ganham características dialéticas, são contraditórios (afirmam e negam, subsequentemente) e tornam-se um duvidoso mestre de cerimônias público; a escolha consegue dar conta do aspecto épico das tragédias e eleva “os vizinhos” a um status de protagonismo, que, paradoxalmente, faz sublinhar a situação central do texto – como um moldura mítica (e pública) em torno do desdobramento privado na casa da família. Então, a dicotomia presente na obra de Nelson Rodrigues: casa/cais, vizinhos, prostitutas, fica muito bem evidenciada quando se fortalece o elo dos vizinhos.
2. No entanto, as escolhas de representação no desenvolvimento dos Drummond parecem colocar em risco essa proposição inicial. Isso porque a construção das personagens e as ênfases das cenas contêm um forte direcionamento dramático (no final do ensaio, na conversa com o grupo, um dos atores referiu-se ao “drama...” ao que foi prontamente corrigido por uma atriz, que disse “a tragédia”). Assim, as personagens protagonizam diálogos intersubjetivos e são direcionadas e determinadas por esses diálogos, bem como pelas relações estabelecidas. Todavia, na tragédia rodrigueana a situação não se deixa levar pelos diálogos... Há uma determinação moral e mítica, as coisas caminham como que levadas por um “fio invisível” já traçado pela moral e pela hipocrisia da sociedade. Tudo já está dado em Senhora dos Afogados... Os caixões preparam-se antes dos seus mortos... O mar chama os Drummond (embora o chamado seja o eufemismo de assassinato)... e os Vizinhos narram e comentam fatos e perguntam coisas que parecem já conhecer.
Mas as personagens, neste ensaio, parecem ser construídas com base numa motivação psicológica, o que cria situações irresolúveis e momentos esquizofrênicos. Por exemplo, o primeiro quadro da tragédia: Clarinha acabou de morrer no mar (tal qual Dora)... Não se sabe se suicídio, acidente ou mesmo assassinato. Mas mãe e filha discutem, entre outras coisas, o noivado de Moema; ao mesmo tempo Misael está num banquete para sua promoção a ministro; e os vizinhos, como corvos, passeiam ao redor. Tentar resolver este quadro de forma dramática faz com que as personagens percam seu caráter mítico, talvez alegórico e principalmente trágico.
Representar Moema dramaticamente redundaria nas chagas da crise do drama, pois ficaria rebaixada a apenas um espécime patológico dos seres humanos e não como símbolo de uma teia moralista, tragicamente hipócrita e apodrecida que alicerça nossa sociedade – segundo Nelson Rodrigues. Ou seja, os Drummond aparecem, quando representados desse modo “dramático” buscando a verdade de cada indivíduo, apenas como uma família de loucos, assassinos e maníacos – e Moema como a mentecapta de uma trama perversa. E não como o que de fato são para Nelson: representantes trágicos da corrupção e deturpação sociais hipocritamente escamoteados no moralismo (principalmente sexual).
3. Por enquanto parece isso, mas claro que ainda há metade da peça... Tudo pode ser diferente e o terceiro ato pode mudar absolutamente todas as relações esboçadas acima (ou não)... Portanto uma crítica de um ensaio é apenas o ensaio de uma crítica...
4. De qualquer maneira, há algo que chama ainda a atenção: as motivações para lidar com o material de Nelson Rodrigues. De acordo com o debate ao final, o grupo pareceu mais impulsionado em lidar com o aparato técnico de Meyerhold antes de ter alguma motivação objetiva na obra de Nelson Rodrigues. A priori, parece que a obra é apenas a justificativa para o processo criativo embasado pelos treinamentos meyerholdianos. A despeito do grupo crer que a obra seja “atual” e denuncie a hipocrisia da sociedade, parece carecer de algo mais concreto no ‘porque’ de lidar com essa obra (polêmica e controversa, mas jamais consensual ou “genial” por si mesma) nos dias de hoje.
Não por acaso, várias das perguntas, na conversa final, questionavam justamente este lugar. Pois, por enquanto, não estão delineadas claramente quais as relações que o grupo pretende traçar entre a peça e a nossa sociedade atual.
É fácil se conformar com um “rótulo” da genialidade de determinada obra ou autor. O difícil é compreender, criticar e transpor suposto gênio para a representação teatral em outro tempo histórico. Há de se ter cuidado para que a técnica mantenha-se sempre como instrumento e jamais como objeto do ato teatral.
SENHORA DOS AFOGADOS
Duda Martins
Grupos de teatro que permitem abrir seus processos de criação para o grande público merecem crédito por seu ato de coragem. Primeiro porque expor um material inacabado, com todos os seus defeitos e todos os seus avanços é uma prova de humildade no teatro. Depois, o público, que é a razão de ser desta arte, pode ter acesso à um desenvolvimento às vezes mais valioso que o próprio produto final.
Foi essa a sensação ao assistir o ensaio aberto da montagem da Cênicas Cia de Repertório para o nelsonrodrigueano Senhora dos Afogados. O Teatro Hermilo Borba Filho foi palco de um escancaramento saudável, que nos fez sentir mais cúmplices do teatro que o normal. Sem aparato de iluminação ou figurino, os atores da companhia estavam livres para serem atores (diante do público) e esse é um exercício importante.
Montar Senhora dos Afogados, no entanto, não é das tarefas mais fáceis, por uma série de fatores. O texto já foi alvo de pesquisa de diversos grupos teatrais no Brasil inteiro e a quantidade de olhares distintos sob a mesma obra é infinita. Como produções cinematográficas que se valem das mais mirabolantes abordagens para tratar do mesmo tema, é perigoso que o teatro brasileiro esteja dando voltas ao redor de Nelson Rodrigues. E poucos são aqueles que conseguem, enfim, mergulhar na sua obra.
“Um mar que não devolve os corpos e onde os mortos não boiam!.” Esse é Nelson Rodrigues em Senhora dos Afogados. A Cênicas Cia. de Repertório parece estar entendendo o recado. O estudo do texto feito pelo diretor Érico José, sob a ótica do teatro de Meyerhold não afasta a “sua” Senhora dos Afogados de Nelson e essa é a grande sacada. Assim como os movimentos afroritualísticos adotados por ele também não são maiores do que a obra. Um diretor sábio é aquele que está a serviço do autor. Érico emprestou seus conhecimentos a Nelson e o resultado disso ¬– ainda sem ser resultado – tem sido bom. Mesmo lançando mão da biomecância de Meyerhold, que parte do pressuposto de que, genericamente, o corpo do ator pode dizer mais do que o próprio texto, iluminação, figurino, ou o que quer que seja, neste caso, o recurso não se transforma na questão basilar.
A montagem também parece superar uma outra armadilha de Nelson que é o drama. O texto é trágico demasiado, mas o humor peculiarmente sarcástico tão característico do dramaturgo também está presente. O melodramático, então, é suavizado com a participação do coro de vizinhos – até agora, o melhor e do espetáculo. Antunes Filho disse uma vez: "Os personagens do coro são capachos, o brasileiro sufocado pela sociedade patriarcal, hipócrita. O coro não tem a nobreza, ele está se virando, não teve vez. Os vizinhos e as mulheres do cais são versões modernas das Erínias, deusas da vingança e do castigo, que nas tragédias gregas atormentavam os protagonistas”. Bingo! Antunes acertou e a despeito de braços quebrados, o coro da Cênicas também. Que venha a estreia! Ou será melhor outro ensaio aberto?
IDEM (Many Lovers)
mi-CHE-lotto
É extremamente vantajoso escrever sobre ensaios. Vira também ensaio. E a gente aproveita para escrever sobre, como algo nada muito ligado.
Sobre ensaios
Vi um ensaio aberto de Katastrophè de Beckett, com Michel Lonsdale e era um tanto diferente. Creio que é bom bater um papo, curto, antes, sobre o que vai acontecer, o que vai se propôr, como todos iremos participar etc...
No Ensaio, vemos a coisa em pedaços. Claro que no dia será outra coisa. Essa talvez a grande preocupação do público e do crítico. Mas a gente não se diz todo dia que, cada dia, a peça é diferente? Nossos olhos fatiam constantemente todo aquele trabalho. Então não me parece que haja aí um grande problema.
Daí meu abraço fraterno a Wellington por começar essa prática por aqui.
Sobre peças fatiadas
Na Revista Théâtre Populaire, #44 de 1961, um artigo sobre o Living Theatre se apresentando em Paris, há o seguinte comentário sobre Many Lovers, de William Carlos Wilson: “...você entra e passa uns bons 15 minutos vendo os técnicos preparando o palco enquanto os atores repetem seu papel à meia voz e uma atriz passa a ferro sua roupa e o “autor” diretor não cessando de intervir ao longo da representação. Cenário reduzido ao mínimo e composto sobretudo com pedaços de paus...a luz toda aberta etc ...etc.... ”.
Bom, acho que o que vimos ontem foi o melhor do Living, não?
Então, é sobre essa peça tão moderna chamada “todos estamos no palco!” que eu deveria falar hoje. O papo fica um pouco mais político, um pouco menos lírico. Coisa, das Sing-an-sich, essencial para qualquer papo, já disse o Paulo no seu texto- que eu amei- sobre o Fio Invisível e que tentei comentar, uma vez que eu mesmo, cansado de falas acadêmicas, pedi licença aos leitores para me agarrar só sobre meu coração e não em minha razão.
Dar uma descansada lírica.
Sobre a importância de se encontrar amigos
(vide Aristóteles, em algum capítulo da Poética, sans blague):
Esse espetáculo comporta três ex-alunas e um ex-aluno. Permitam-me falar de amor hoje.
Os outros ainda vou amar, pode deixar...
A primeira fez um Ato Sem Palavras desinformado. De castigo teve que fazer Katastrophè e dessa vez brilhou e continua brilhando por aí, Bruna, a filha.
Vanessa, a mãe, fez Valsa # 6 comigo e Wellington. Criamos um Coro em Valsa e a colocamos no coro. Formou-se, persistiu e está fazendo Nelson lindamente.
Que bem não faz à gente o sair da universidade!
Lane, dessa vez Coro, foi minha rainha e de Ban num Obaldia.
No papel principal ou no fundo do palco ou na platéia, é e será sempre nossa rainha.
Todos sabem que eu odeio pessoalmente diretores. Acho que o século XIX e a primeira metade do XX já acabaram. Mas aceito um ou dois, como Wellington, Ban, Érico e eu. Dizer que Érico foi meu aluno só me enche do mais santo orgulho. Eu o acompanhei quando pude. Fui sim. Fui a salvador só para vê-lo fazer um magnífico trabalho de bufão. Eu o seguiria até o fim dos tempos. Azar para quem não é, como eu e meu novo amigo Jorge Bandeira, Ara Watasara. O que não sei dizer que significa em japonês, mas graças a deus NÃO é japonês, é nossa língua geral, Nhengatu, a língua do Brasil, queiram uns ou não queiram outros. Então, maninhos, eu tenho algumas reservas ao que vi ontem. Mas Érico e os meninos da companhia resolverão tudo a tempo.
O que significa Ara Watasara? Perguntem a esse segundo índio que está na platéia do Seminário. O primeiro é Polly minha doce e bela iracema. O outro é esse menino tranqüilo que está me espantando com seu conhecimento, passando de Samuel a Meyerhold sem fadiga. O Jorge Bandeira, meu irmão ara watasara. Ele é sábio não por que acumula conhecimentos e os vomita por sobre a espantada audiência, mas por que os passa. É isso o que ele entende por passantes, passeios, andarilhos.
Não deixem de ler dele: A fabulosa loja dos bichos, pela editora Valer.
Por que “perguntem ao Jorge”? Por que ele tem uma coluna aqui também e é só abrir os comentários e falar com ele. Ele vai gostar. E também por que, pelo menos eu, só estou escrevendo para meus colegas de sala. São tantos amigos novos que estou louco para me pavonear para eles. Quando eu quiser escrever para os que vão ao teatro, escreverei em jornais. Até por que, quem lê crítica em Recife, é mesmo apenas a classe teatral.
E essa é ainda uma afirmação muito temerária.
Pois talvez ainda não tenhamos tanta classe assim.
Sobre Nelson
Permitam-me, antes de mais nada, uma homenagem a minha ex-sogra. Foi uma das pessoas mais bondosas que conheci no Planeta Terra. E tenho certeza, lá em cima também. Que fazer, ela acreditava piamente que havia o “lá em cima”. Não vou ser eu quem vai tirar isso dela.
Quando aqui cheguei, depois do longo inverno de nossa desesperança chegar ao fim (pensávamos tolamente), entrei no apartamento de Mãezinha e por sobre o piano estava o retrato de Nelson:
Eu (admirado)- Mãezinha, você também gosta dos escritos dele?!!!
Mãezinha (admirada)- Mário nunca escreveu nada, meu filho!
Eu (prá lá de admirado)- É o pai dele? Mãezinha, me diga, essa é a foto do Maracanã?
Mãezinha (já achando que tinha casado mal a filha)- Não, Paulo, não. É só o Mario.
Mário Rodrigues nunca escrevera uma só linha em toda sua vida. Era exatamente a cara de Nelson, com papada, aquela cara meio bovina e tudo. E era irmão dela.
Aí fui pesquisar e descobri que eu acabara de entrar na família de Nelson. Os restos que andaram ficando por aqui. Que pouco sabia ou se interessava pelos que haviam partido. Para o Rio de Janeiro.
Eu nasci no Rio em 1944. Os italianos morriam de medo. Todos acreditavam que todos italianos eram Mussolinis. Era guerra. Mas todos crescemos rindo. O carioca é um povo dado a amenidades disse o Sábato e com ele todo a mineirada ruim- por que falsamente séria- que injustamente invadiu o Rio, capital do país, capitaneados pelo Capanema. Por isso os mineiros quando podem nos alfinetam, vide entrevista antiga, de título O Último Crítico, na Piauí: “Cariocas são dados a festas, ao riso fácil, sei lá...”
Nelson foi pro Rio. Que era alegre mesmo, na mais larga das acepções do termo. E lá aprendeu a rir? O que sei é que cada vez que vejo Nelson virar tragédia, solamente tragédia, eu fico pensando se quem fala Nelson não está pensando Sábato. Que são duas coisas inteiramente di-fe-ren-tes.
Eu vi Paulo rir na minha frente, numa daquelas tiradas que só o Nelson tem. “Eu sou sua única filha!” Como um mineiro conseguiria rir da necessidade de uma filha querer apagar da memória da família as outras irmãs, para ela poder ser a única filha? É sublime, é uma piada sublime! E nada a ver com psicanálise e freuds, por que nem Nelson nem ninguém no Rio nunca o havia lido e nem lerá.
E é isso que talvez eu tenha a dizer sobre Nelson. Morro de medo de fazer Nelson. Passei a temê-lo depois que ouvi dizer que sua obra se dividia em:
(a) peças míticas, (b) psicológicas, (c) de embreagem fácil, (d) epifânicas, (e) Etceteras...
Quem divide assim é o Jean Anouilh. A sua obra. E não a dos outros, gente fina que era. Ou o Borges, cabra de enorme humor negro que era, tanto que foi viver na Inglaterra.
Desculpem-me. Mas um senhor que exige de nossos frígidos canais de televisão, que haja uma cabra ao lado dele como único ser vivo a assistir seu programa, não tem a menor vocação para tragédia. Tragi-comédia talvez. Pois esse era o gênero recém-descoberto. Ele era um bufão. Ele era um bufão. Ele era um carioca da gema. “Carioca da gema do ovo”. Que “rebola, bola,diz que dá que dá que dá, diz que dá que dá na bola, na bola você não dá” (música infantil dos anos 50).
Não tentem transformá-lo em “mineiro”, por que não dá não dá não dá não dá.
Alguém aí tem dúvida que Érico irá nos espantar com seu Nelson? Ele também é um bufão, ele também é um bufão. No Ensaio - era um ensaio - ainda vi uma leve persistência de um tom que não me agrada, que penso continuar envenenando a obra de Nelson, esse legítimo pôrralouca. Se há um nome dos anos 60 atribuível a ele é esse. Ele não se nomeia reacionário? Então estou sendo bem bonzinho, não?
Por quê? Ele não “descreve” a vida suburbana. Ele a faz agir em palco.
Toda sua obra vem de sua escritura jornalística. Seu público leitor, senhores, era eu, meu pai e um bando de mequetrefes. Um povinho do qual saiu uma pessoa louca armada procurando quem havia escrito que ele era corno e sapecou os tiros no primeiro Rodrigues que encontrou: seu irmão.
O corno(possesso, sentindo dores no chifre)- Morre você mesmo, já que seu pai não está aqui!
Tem gente que pensa que isso é folhetim de Nelson. Isso é que é ser suburbano. A morte ali, estúpida. Seu irmão pagando pelo pai, que não tinha talvez tanta dívida para tanto sangue derramado. Isso é ou não é Nelson?
Então, para toda obra de Nelson, comentada por Sábato e seguida por outros, me desculpem, tô fora e não abro.
Ah meu deus os ignorantes!
Ignorantes(com muita ignorância)- Mas o que é que ele tem contra Sábato? Inveja? Raiva? Amor não respondido?
Michelotto(angelical, com olhos do gato de Shrek, querendo se passar por um tal de Nelson)- Parem de ser suburbanos, pelasenhoradosafogados!
Eu fui com Sábato ver pela décima terceira vez, da parte dele, A falecida , de Nelson, lá no Sesc Pompéia. Esse amor de gente – todo mundo o conhece assim- estava escrevendo sobre a obra de Antunes e via, revia, revia. É um dos maiores pesquisadores do Brasil. É um leitor esfaimado. Ô cara, quem sou eu para comentar essas coisas dele! O que digo é apenas que, às vezes, nossos critérios de julgamento nos parecem bons, os melhores - no caso de um pesquisador- mas a gente entra em descompasso com o tempo. Ou sei lá por quê! Sei que a vida copia o teatro: cada dia é diferente e às vezes fazemos tanta coisa nela que distraímos de algumas essenciais. O banal. O banal é sempre essencial, me disse o Borges, me disse Nelson. O grande amigo de Nelson quis torná-lo sério, homem de letras, igual a José de Alencar ou algum outro da Academia. Coisas que só se faz para um amigo. E que o amigo, Nelson, deve ter ficado quieto e aceitado, pois afinal só sobrara esse como único caminho para ser reconhecido em um país de merda, pseudo-literário na maioria da vezes, um Rio besta cheio de mineiros bestas e engordados por sopinhas de belas letras e por outras sinecuras mais, que só um Capanema pode lhe proporcionar. E olha, era um mineiro, um desses mineiros, quem pacientemente se debruçou com ele sobre sua obra e sobre inúmeras médias de café com leite das madrugadas cariocas nos anos 50 e 60, quem sabe sentados ao lado do Michelotto, o Sylvio, meu pai do Diário da Noite por que a noite sempre junta os jornalistas.
Como não aceitar um presente de grego desses?
É essa minha versão pessoal para o que leio de Nelson e meus amigos (queiram eles ou não) Paulo Mendes Campos, Décio de Almeida, Mariângela, Sábato e tantos alguns outros.
Por favor, se um dia eu tiver uma lápide, ponham nela:
Lápide( rosa marmórea, límpida, florida e das mais caras)-
Aqui jaz o Michelotto.
Foi por amor.
Foi por amor que ele escreveu sempre.
Mesmo que muitas vezes se tenha enganado redondamente.
The rest is silence.
Michelotto (no céu, já chorando com pena de si mesmo) - Eles me amavam, cacêta!!!
Senhora dos Afogados pela Cênicas Cia de Repertório
Por Jorge Bandeira*
Gostaria de esclarecer que este crítico teatral do Amazonas escreve pela primeira vez sobre um trabalho em andamento, um work in process. Portanto, sinto-me na obrigação de superar-me e tentar, de forma sucinta, embarcar neste terreno perigoso de escrever algo sobre o que não pode ser, ou que seja apenas uma pálida imagem de um resultado final a ser levado à cena teatral de Pernambuco em setembro.
As coisas mudam com a força da maré. Mar. E sobre esse Mar que me escapa é que começo a tecer este texto, pois este elemento tão importante foi eclipsado pelo trágico de Senhora dos Afogados, e talvez, digo talvez com a certeza que os restante da carpintaria cênica aparecerá para resolver estes vazios, a colossal estrutura metálica no seu formato triangular para o espectados tenha contribuído para este “apagar” da atmosfera marítima, no texto de Nelson Rodrigues um dos constituintes fundamentais da trágica história de Misael Drumond e Moema.
Entendi perfeitamente a preocupação do elenco em demonstrar as etapas desta pesquisa que se alicerça sobre as teorias de Meyerhold e sua bio-mecânica, e acredito que este trabalho de contenção dos movimentos será ainda mais revitalizado, pois as marcas de entrada e saída estão fora deste compromisso de dialogar com o mestre russo. Questão de aprimorar tudo, e isto virá com a visualização total destes encadeamentos de cena, aqui mostrados em sua fase embrionária.
Trata-se de uma tragédia nos moldes clássicos, portanto, a leitura parcial deste primeiro ato(restam dois para a conclusão do texto de Nelson) permite apenas que o crítico aponte motes já resolvidos pela encenação. Um deles é o uso da estrutura metálica projetada com escadarias laterais e praticáveis em módulos que se sobrepoem como elementos incorporados à movimentação da cena e suas variações emocionais e de impacto ao espectador. Uma arquitetura de cena famosa no começo do século XX, via Gordon Craig, Appia e outros mestres do teatro. Até mesmo a clássica montagem de Vestido de Noiva referendou este legado.
O gigantismo da estrutura, insisto, não poderá desequilibrar a organicidade do espetáculo, caso contrário as personagens, em especial os elementos cruciais do coro de vizinhos e vizinhas, terá um tímido desempenho. E o coro desta Senhora dos Afogados da Cênicas Cia é o verdadeiro fio de ariadne para a compreensão estética, de linguagem, abraçada por esta Companhia Teatral.
A geometria tende a causar esta organicidade, este lapidar das retinas para as cenas marcadas, até aqui, neste ensaio aberto de 20/08/2010, dentro da Programação do Seminário Internacional de Crítica Teatral, funcionou a contento, mas esta mesma geometria pode levar aos intérpretes a uma acomodação da técnica da interpretação pelo comodismo tácito do geometrismo e marcas, mecanizando e enfraquecendo a trama trágica de Nelson. É apenas um ponto de reflexão, somente.
As máscaras, os conflitos familiares, este coro de vizinhos está na mesma transitoriedade de uma Yerma ou Bernarda Alba, e a correnteza deste mar de labdácidas arrasta tudo que encontra pela frente. As rezas e as danças circulares também estão neste nível do “aparecimento”. Falou-se no debate após este ensaio aberto(o segundo) que a pesquisa das manifestações afro-brasileiras foi realizada em dois terreiros. Talvez um comprometimento maior com estas entidades, muitas delas ligadas às forças do mar, seja o que falte para que a cena tenha um resultado mais plausível. Creio, somente.
Realizar com o corpo em sua totalidade, com o transe merecedor de autenticidade teatral, se isto é possível. Por isso as vozes dos personagens, nos momentos de alta tragicidade deste ato visto, sejam ecos apenas de uma possível desgraça, avassaladora, que deve jorrar sangue de todos os poros. Não estou aqui pretendendo que a pesquisa seja uma panacéia de defesas dos orixás, nada disso, mas ao entrar neste universo as trocas são necessárias, pois as energias também circulam de ambos os lados.
Atos extremados como os assassinatos tornam todos estes personagens vulcões em erupção, e uma interpretação contida, mesmo que na sua forma técnica perfeita, talvez “limpe” o vigor destas cenas em demasia. A punição e a culpa, nesta catarse que se faz necessária, não pode deixar de aparecer ao público, assim como este mar revolto, que em setembro deve demonstrar toda sua força.
*Crítico de arte, amazonense. Conselheiro de Cultura de Manaus, ator, diretor, dramaturgo, tradutor, poeta, coordenador do cine-clube Lippomusic . Historiador e especialista em História Social da Amazônia, História e Crítica da Arte(UFAM), Africanidades(UnB)
quinta-feira, 22 de julho de 2010
terça-feira, 8 de junho de 2010
Vídeo acima: Pesquisa de Campo no Terreiro de Xambá - Festa de Iemanjá dia 30 de maio de 2010.
Dando continuidade a pesquisa das manifestações ritualisticas das religiões afro descendentes, o grupo Cênicas Cia de Repertório participou da festa para Iemanjá que aconteceu no Terreiro de Xambá. Movimentações orgânicas advindas da energia que circula pelos corpos, vocalidade do espaço e dos corpos, danças circulares, oposições, transe, religiosidade, culto e ritualista; Tudo isso num caldeirão vivo e pulsante que envolveu a todos.
quinta-feira, 6 de maio de 2010
Por Bruna Castiel
O trabalho tem sido duro: conciliar atividades diferentes, algumas delas que não aceitam menos do que total entrega. Dentre as relações e situações, os desenhos e os movimentos vão se formando. A beleza salta aos olhos, repentinamente, quando a energia harmônica estende-se entre os corpos. Não interessa palavras floreadas, gesto pelo gesto, incoerência pela estética. O bem maior é o sentido dos diferentes temperamentos energéticos. Uma força de ímã que repele e atrai, traz a velocidade e o ritmo da ação. As cores, as sensações, as imagens, misturam-se aos contornos relacionais. Esqueça o palco, mas sinta sua presença. Abstraia o teatro, porém não o “ser ator”. A proposta é mais simples do que a imaginada, entretanto sua complexidade afronta as almas ansiosas por razões. Em um piscar de olhos: um, dois, quatro meses passaram! Sim, algo de verdadeiro fora construído...
Bruna Castiel é atriz do Cênicas Cia de Repertório e está no processo de Senhora dos Afogados, de Nelson Rodrigues que estreia em 18 de setembro de 2010, no Teatro Hermilo Borba Filho. A direção é de Érico José.